sexta-feira, 6 de maio de 2011

O desemprego é involuntário

A crise e as políticas recessivas de austeridade geram desemprego. O número de casais desempregados quase triplicou nos últimos cinco meses e a taxa de desemprego, segundo previsão, que provavelmente será revista em alta, chegará, em 2013, aos 13 por cento. O desemprego que conta é obviamente um fenómeno involuntário e tem custos sociais elevadíssimos.

Curiosamente, a troika e a economia convencional agem como se o desemprego fosse um fenómeno sobretudo voluntário. O seu modelo, que orienta as políticas públicas, é uma versão sofisticada do "vão trabalhar, malandros". Um modelo que prospera em tempos de crise devido ao medo e à desconfiança.

De facto, a justificação para a redução planeada dos montantes e da duração do subsídio de desemprego centra-se na geração de mais "incentivos" à busca de emprego. É como se os indivíduos, egoístas e preguiçosos por natureza, precisassem de uma maior pressão, como se a responsabilidade pelo desemprego fosse sua e não de uma crise sem fim à vista.

Na realidade, o objectivo central, a lógica de todas as modificações laborais é fazer com que os trabalhadores, os que têm emprego e os que não têm, aceitem uma redução substancial dos seus rendimentos. A redução de salários, sobretudo na base, é a receita medíocre que é imposta ao país.

Numa formulação propositadamente ambígua, parece que há uma intenção vaga de vir a "apresentar uma proposta" para eventualmente alargar um subsídio de desemprego, agora mais frágil, a certas categorias excluídas. De vagas intenções está este inferno laboral cheio.

Será que esta é a economia, com muito medo, própria de países com trabalhadores desqualificados e precários, de que necessitamos? Obviamente que não. Uma economia moderna, uma economia que dê incentivos à formação e à inovação, não trata assim os trabalhadores, não desiste com esta facilidade de políticas económicas que combatam a crise e gerem emprego.

Artigo no Público

12 comentários:

  1. 1. O «subsídio» de desemprego é, na verdade, um seguro de desemprego, pago pelos trabalhadores. Não se trata de uma mera prestação «social». Aqui, «pagar o que se deve» parece, nas bocas de muitos «intelectuais» de serviço, obrigação a morigerar.

    2. A ideia de que é necessário dar «incentivos» aos desempregados para sairem do desemprego é mais uma expressão da «gramática liberal» (para retomar a noção da escola francesa da economia das convenções) que tende a fazer recair as responsabilidades sociais, políticas e económicas sobre os indivíduos. Estes, encontram-se frequentemente votados à condição de «indivíduos por defeito», como bem explicita Robert Castel. Enquanto tal, assenta em pressupostos absolutamente falsos sobre o funcionamento das sociedades e sobre a acção humana.

    3. Enquanto a discussão estiver a este nível, isto é, dos discursos que enraizam bem no solo fértil das conversas de cafés mal frequentados, não vamos a parte alguma.

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  2. Mais do que isso, aumenta a concorrência laboral, o que fará com que cada um dos que ainda tem trabalho se esforce ainda mais, ou seja, trabalhará mais, o que implicará uma maior redução do trabalho disponível para ser realizado, o que por sua vez, aumentará o desemprego.

    No quadro actual, de diminuição de volume de trabalho necessário devido à migração de postos de trabalho para outras paragens e ao aumento de produtividade, a solução não é cada um trabalhar mais, mas pelo contrário, cada um trabalhar menos, mas mantendo o mesmo rendimento para que dessa forma aumente a procura e assim se aumente a quantidade de trabalho disponível. Obviamente, se se paga mais, a riqueza necessária para pagar a mão de obra terá que aumentar e para tal, terá que se diminuir drasticamente os lucros, em especial os lucros financeiros.

    Recordemos que, em rigor, o volume de trabalho existente assim como os recursos existentes produzem o suficiente para todos os elementos da sociedade. Talvez seja hora de questionar a sociedade em que vivemos: o objectivo da nossa sociedade é o lucro de alguns ou o bem estar de todos?

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  3. Tenho uma loja, vou abrir outra e estou a recrutar pessoas. Marquei 10 entrevistas para segunda e outras 10 para terça. Apareceram duas pessoas em cada dia.

    Não sei se é conversa de café, mas há, de facto, pessoas que não querem trabalhar. Repito: não querem. É voluntário.
    Se eu perder o emprego, não conseguir arranjar outro no ramo, que peça as mesmas habilitações, pode crer que aceito trabalho mais humilde.
    Há muita gente que não pensa assim.
    Mais uma vez, para que não se esqueçam: há desemprego voluntário.

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  4. Há um dado que deve ser relembrado. Que é o facto de metade dos desempregados não receberem qualquer subsídio. Esses serão desempregados porquê?

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  5. Ao anónimo que escreveu às 23:16 - primeiro, espero que a ideia de «conversa de café» não tenha parecido um acto de snobismo; a ser assim, peço antecipadamente desculpa.

    Bom, certamente pode haver casos de pessoas que não quererão trabalhar. Mas, em primeiro lugar, não se pode universalizar um caso particular; sendo a lei geral, isto é, abrangendo o universo dos que caem na respectiva classe de indivíduos, não podemos prejudicar certamente a esmagadora maioria, em desemprego involuntário, sob o pretexto de haver casos de desemprego voluntário subsidiados; em segundo lugar, cabe aos serviços públicos de emprego fiscalizar estas situações - que, aliás, têm regras e não é obrigatório uma pessoa aceitar qualquer emprego. Em terceiro lugar, apesar de tudo, como contribuintes, terão pago alguma coisa para terem direito ao seguro de desemprego.

    Segundo Avishai Margalit, filósofo de renome, uma sociedade decente é uma cujas instituições não humilham os seus membros. Para este filósofo, combater a humilhação é mais urgente que construir uma sociedade justa, porque reparar um mal é mais premente que promover um bem. Penso importante não humilharmos todos a partir de enunciados existenciais, como do tipo «há pelo menos um que prevarica». Ora, a «regra» institucional proposta por esta direita é uma regra que humilha.

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  6. Caro A.C. Martins, muito obrigado pela sua resposta.
    Antes de mais, não precisa de pedir desculpa, não interpretei a "conversa de café" como snobismo. Interpretei como a caracterização de um argumento como não pensado e não ponderado.
    Posso dizer-lhe que, no meu caso, não é.
    Eu sei que a lei é geral e que não pode ser uma excepção a definir todo um grupo. Sei-o por ter tido algumas cadeiras de direito e por ser uma fórmula repetida sempre que se fala deste tipo de assuntos.
    Mas é uma falácia. Porque só seriá um argumento válido se se tratassem, de facto, de excepções. Não são. Desta vez não apareceram 16 pessoas em 20, mas não é a primeira vez que eu procuro empregados. E, mesmo nos que trabalharam para mim, podia encher esta caixa de comentários de exemplos de maus trabalhadores que me prejudicaram o negócio. Eu só falei destes 16 porque foi o exemplo mais recente e é também o mais incrível, dado a crise que vivemos. Mas há muito mais. No meu negócio e no negócio de outros como eu (vou conhecendo bastantes).
    Desvalorizar isto com um "não é por uma pessoa não querer trabalhar que devemos prejudicar todos os desempregados" é como eu desvalorizar opiniões como a sua com "vê-se que nunca teve um negócio e nunca deu emprego a alguém". Até pode ser verdade, mas não é argumento válido.
    Cumprimentos

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  7. Caro,

    Lamentavelmente, estive aqui a escrever e perdi tudo o que escrevera.

    Assim, telegraficamente, vou dizer o seguinte:

    1) Agradeço (algo que não deveria ser, infelizmente, necessário) o tom cordial do diálogo.

    2) O argumento que apresento não é falacioso; apenas, não o terá compreendido. A lei actual já prevê a penalização de quem «prevarique». Da má aplicação da lei não se segue que a lei seja má, mas que a sua aplicação o é e por conseguinte pode ser melhorada.

    3) Da má aplicação da lei não se segue que seja necessário dar «incentivos» para a saída do desemprego. Aqui, desde logo, porque o desemprego não é todo involuntário. E, de um ponto de vista normativo, considero que esta visão não é boa, porque, como afirmei apoiando-me em Margalit, é mais importante não injustiçar e humilhar (o conceito devia ser esclarecido, mas não o farei, antes que perca o texto outra vez) uns apenas para fazer justiça sobre outros. Seria fazer «pagar o justo pelo pecador», não é?

    Bom, o argumento não é falacioso, é válido. Gostaria muito de ser mais preciso, mas pelas razões aduzidas, não o farei.

    Obrigado pela atenção e um bom fim-de-semana.

    PS-Espero que possa resolver o problema que explicita.

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  8. Queria evidentemente dizer no post anterior «desde logo porque o desemprego não é todo voluntário».

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  9. A esquerda não deve negar a realidade e a verdade é que conheço ( todos conhecemos)casos em que as pessoas dizem ir usar o sub. desemprego até ao fim e depois é que irão começar a procurar trabalho.

    Eu sei que para a direita é fácil lidar com isto pois para ela " os trabalhadores são tendencialmente preguiçosos e aldrabões, querendo viver de subsídios".

    A verdade é que já há muita gente a fazê-lo, infelizmente, prejudicando os outros, os que não conseguem mesmo arranjar emprego.

    É muito interessante ler autores que se debruçam sobre estes temas, mas temos que nos lembrar que se há muita gente de direita que não sabe do que está a falar porque não vai ao terreno, a mesma ignorância acontece na esquerda, e então, uns defendem e outros atacam,não tendo nenhum dos grupos completa razão nessa generalização.

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  10. Quando é que as pessoas aprendem de uma vez por todas que os trabalhadores são bons e os patrões são maus?
    Será preciso fazer um desenho?
    Porra!

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  11. Os trabalhadores são bons e os patrões são maus e estar no desemprego é assim-assim.

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