quinta-feira, 12 de maio de 2011

Dizer: basta!

Os rumores sobre a saída grega do euro são elucidativos sobre o poder que a periferia europeia detém no panorama europeu. No momento em que sabemos os incríveis juros que nos serão cobrados pela EU - entre 5,5% e 6%, contra os 4% agora cobrados à Grécia -, vale a pena olhar com atenção para o que aconteceu em torno destas notícias.

A ameaça de saída foi noticiada pela imprensa alemã, segundo fontes do governo. É impossível perceber o que aconteceu na realidade, mas não é muito difícil acreditar que a ameaça tenha realmente existido. E claro, uma das formas de a minar é colocar a notícia em público quanto antes. Não há saídas do euro previamente anunciadas. De qualquer forma, o Governo grego conseguiu com esta manobra, real ou imaginária (sim, estas notícias também dão muito dinheiro à especulação financeira), um novo pacote de ajuda e uma discussão bastante mais profunda dos seus problemas e alternativas, como já discuti neste post.

No relançado debate sobre a Grécia, surgiram dois interessantes textos no New York Times sobre uma possível saída da Grécia do euro. Um do economista Mark Weisbrot, co-director do excelente Center for Economic and Policy Research, e outro do Paul Krugman. Ambos discutem de forma séria, e não apocalíptica, como por cá vem sendo hábito, uma possível saída do euro. Desnecessário dizer que ambos os economistas concordam com a tragédia que são as actuais escolhas. Mark Wreisbrot, não desvalorizando o poder da ameaça de saída numa possível reforma europeia, defende esta escolha, partindo da experiência argentina.Uma desvalorização cambial permitiria maior competitividade externa e a soberania monetária conduziria a menores restrições de financiamento da economia. A inflação aumentaria neste contexto, com os seus prós e contras que ficam para outro texto.

Para este economista, e como devia ser claro para quem quer discutir o assunto, não há saída do euro sem uma reestruturação profunda da dívida externa total (pública e privada). Ora, uma reestruturação da dívida grega de, imaginemos 50%, colocaria o sistema financeiro europeu e mundial numa situação de grande fragilidade, devido à magnitude dos custos. A Argentina já não serve como comparação. Tal "corte de cabelo" seria inédito. Estas implicações merecem, por isso, mais reflexão.

Paul Krugman prefere, no entanto, assinalar outros contras, nomeadamente os problemas logísticos de tal decisão. Tais dificuldades não são muito credíveis. Uma mudança de moeda não necessitaria mais do que um "selo" nas anteriores notas em circulação. Foi o que aconteceu quando a Eslováquia e a Républica Checa se decidiram pela soberania monetária (uma decisão posterior à cisão política). Krugman aponta também os inevitáveis problemas de reputação internacional da Grécia que comparam com o longo historial argentino de incumprimento. Os problemas existem, mas sinceramente parece-me que, neste campo, já se ultrapassou, para a Grécia, o ponto de não retorno. Finalmente, o prémio Nobel assinala a importância desta ameaça nas negociações europeias. Tem razão e para estas ameaças serem credíveis, há que pensar mais e melhor.

5 comentários:

  1. João Carlos Graça12 de maio de 2011 às 16:16

    Caro Nuno
    Bom post. A honestidade intelectual nunca é demais. Quanto à tragédia das actuais opções, ela releva no fundamental, parece-me, da escolha trágica que já foi a nossa adesão à UEM. Dadas as características da mesma, o "cenário" actual é algo implícito desde o princípio...
    Também me pareceu muito certeiro o artigo do Weisbrot e também acho que as "dificuldades lojísticas" apontadas pelo Krugman são um tiro para o lado e uma desculpa esfarrada (deixando agora de lado outras coisas de que falei acima, em comentário ao post do João Rodrigues).
    Dito isto, "there may be trouble ahead" por uma via ou pela outra, claro que sim. A diferença, para além mesmo das dificuldades da dívida, está na capacidade maior para fazer face à origem da mesma, isto é, aos défices externos recorrentes.
    E quanto a isso, e embora reconhecendo o carácter "único e irrepetível" de cada caso: desvalorização explícita "argentina", ou desvalorização interna "báltica"?...

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  2. E esta hem?

    http://revoltatotalglobal.
    blogspot.com/2011/05/
    internacional-portugal-alemanha.html

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  3. João Carlos Graça15 de maio de 2011 às 12:36

    Escelente post, Nuno!
    Já o dizia no meu comentário anterior (é pena que tenham desaparecido) e agora repito (espero que este permaneça):
    O fundamental das alegações anti-saída do Krugman releva duma visão mais ou menos abertamente racista da Grécia - estes meridionais incapazes de se auto-governarem, etc. - e muito rósea da UE: a "grande aliança democrática" e todo o demais mumbo-jumbo... aliás particularmente enviesado de forma "americanocêntrica".
    Se deixarmos de lado este "filo-europeísmo" (que no caso de Krugman parece de facto uma variedade de "filo-atlantismo") e esta visão racista sobre os meridionais... o que é que ainda sobre dos argumentos de PK contra a saída?
    Só é pena, claro, que a tal visão racista relativamente aos meridionais assuma também tantas vezes, quanto a estes, a forma dum "auto-racismo"... e mesmo em sectores de onde não se esperaria isso...

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  4. João Carlos Graça15 de maio de 2011 às 12:44

    Ah, sim, mais Greek Out do Krugman: http://krugman.blogs.nytimes.com/2011/05/10/more-greek-out/
    Parece-me aproximar-se dos pontos de vista do Weisbrot, que segundo me parece tem razão neste assunto:
    "bear in mind that the first piece is already a foregone conclusion: everyone knows that Greece won’t repay its debt in full. The problem is that even if the country defaults on its debt, it still faces the problem of wages and prices way out of line with the core euro countries. So devaluation is what you do when default isn’t enough".
    O debate político, entre nós, está mesmo tão atrasadinho!...

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  5. E quando começaram os BOATOS acerca da restruturaçäo da dívida tuga? 6 de Junho?

    "Rumor" é o que faz o vento a bater nas folhas!

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