quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O Elefante na sala


"Não são só os alemães. É espantoso como toda esta crise foi orçamentalizada [fiscalized, no inglês]; Os défices, que são de forma esmagadora, um resultado da crise, foram retroactivamente considerados a causa. E ao mesmo tempo, pessoas influentes em todo o Mundo agarraram-se à ideia de austeridade expansionista, tornando-se cada vez mais determinadas na sua defesa enquanto a alegada evidência histórica se desmoronou."

Paul Krugman

É de facto espantoso que se esqueça que os problemas orçamentais são o resultado da crise. Não apenas da crise, mas sobretudo da crise. Quanto mais não seja, porque se agravaram decisivamente depois. Só não é tão espantoso por ser uma narrativa que tem óbvias conveniências em termos da agenda política liberal. Para já, porque permite atirar para segundo plano, quer a desregulação dos mercados financeiros que provocou a crise, quer as assimetrias na construção europeia que lhe potenciaram o impacto. Mas também porque, se aceitamos que o que criou toda esta situação foi um surto despesista, então nada como cortar a eito para resolver o problema. E onde é que se corta? Nas políticas públicas.

12 comentários:

  1. É epantoso que fingimos que não existiam problemas orçamentais antes da crise. Leia-se Álvaro Santos Pereira. A crise tem as costas largas.

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  2. Se pensarem bem vão chegar à conclusão muito óbvia a qual é a seguinte: as politicas deste país(e não só)têm sido conduzidas ao longo das decadas de forma a chegarmos precisamente onde estamos(step by step)com o objectivo ocultado de centralizar o poder,e isto independentemente de quem beneficia no fim!
    E só assim vão conseguir ver a floresta e não apenas algumas arvores!

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  3. Quem será a Tunísia da Eurozona?

    Apostas aceitam-se...

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  4. Concretizando o que disse o 1º Anónimo.

    "É de facto espantoso que se esqueça que os problemas orçamentais são o resultado da crise."

    Olhe por favor para este gráfico (http://desmitos.blogspot.com/2011/02/finalmente-boas-noticias.html) e, ressalvando que diz respeito à dívida externa líquida e não directamente ao défice, e diga-nos em que ano ocorreu a crise a que se refere.

    O que é espantoso é como é possível ignorar a realidade para debitar lugares comuns (perdoe-me a expressão)!

    Reafirmo o desafio: em que ano ocorreu a crise?

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  5. Caro António Carlos,

    A dívida externa tem causas diferentes das do défice público. Aliás, em boa medida opostas. Nesse sentido, é completamente absurdo usar esse indicador para discutir o problema do défice público...

    A resposta ao seu desafio é óbvia. A crise de finais de 2008 e teve o seu impacto fundamental na actividade económica em Portugal durante o ano de 2009, através da contracção do crédito e da queda procura agregada. O meu post abaixo mostra o impacto que essa quebra na actividade económica teve na receita fiscal e, por essa via, no défice e na dívida pública. O salto desses indicadores é evidente e não tem nada a ver com a evolução da dívida externa, que tem outras causas como o endividamento financeiro, a dependência energética e o défice comercial.

    Dizer que os problemas orçamentais geraram a crise é um delírio. A crise eclodiu em 2008 e o défice aumentou de 2,6% para 9,3% em 2009, por razões que se prendem não só, mas também com essa crise.

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  6. claro que o crescimento do crédito colapsou em 2008. Esteve a crescer bem acima do PIB durante anos a fio. A não ser que o estivessemos a usar para contruir infra-estruturas que efectivamente nos tornassem + produtivos e fábricas,(que não estávamos), esse crédito nunca vai ser totalmente pago. Em vez disso inflaccionou-se o preço da habitação e banalizou-se o crédito ao consumo. Quem afirma que o crédito é o motor da economia, de economia percebe muito pouco. 1º alguém tem que poupar para criar uma pool de capital que aí sim poderá ser investido.
    o dinheiro fiat tem os dias contados, porque mais tarde ou mais cedo os senhores do dinheiro vao imprimir o que for preciso para salvar as elites financeiras e os governantes corruptos e incompetentes e vai mandar o valor do dinheiro pela sarjeta. Pode levar anos, e poderemos até ter deflação entretanto, mas o end game do dinheiro papel está traçado desde o dia em que nasceu.

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    com/2010/12/white-dragon-society
    -6-jun-2010.html

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  8. Caro José Gusmão,

    antes de mais peço desculpa pelo atraso na minha resposta e espero ainda "ir a tempo".

    Confesso que não percebo a sua afirmação "A dívida externa tem causas diferentes das do défice público. Aliás, em boa medida opostas."

    À partida parecem evidentes duas relações:
    - o défice orçamental (público) gera o aumento da dívida pública e, na ausência de poupança interna, de dívida externa;
    - o aumento da dívida pública (em larga medida incorporada na dívida externa) faz aumentar o encargo com juros (que neste contexto ainda por cima aumentam) logo contribui para um aumento do défice.

    Resumindo, a ocorrência de problemas orçamentais ao longo dos anos tem reflexo no crescimento contínuo de dívida externa.

    "Dizer que os problemas orçamentais geraram a crise é um delírio." Dito assim é.
    Mas o que deve ser dito é que o impacto da crise financeira internacional em Portugal ("a nossa crise") resultou e agravou-se devido ao acumular progresivo de dívida externa.
    E mais, em certa medida, essa crise interna era inevitável como mostra o gráfico. Se não tivesse surgido a crise internacional (elemento catalisador), até onde considera que poderia continuar a crescer o nosso endividamento externo?

    Há ainda quem argumente que grande parte dessa dívida é privada e não pública e aí é que está o problema. Formalmente até pode ser verdade. Mas a dívida do SEE (TAP, RTP, CP, Metros, ...), do SEL, induzida nos parceiros privados através das PPP, ..., é verdadeiramente privada? Como é que o governo executou o programa de remodelação do parque escolar? Recorreu ao orçamento e a dívida pública? Ou criou uma empresa que rapidamente se tornou a 5ª mais endividada do SEE? Isso é dívida privada?

    Para terminar, o que o gráfico mostra é que o crescimento continuado da dívida externa não foi resultante da crise internacional. E que esse é neste momento o principal problema de Portugal (se não fosse não haveria qualquer problema com a falta de financiamento externo). E que a existência de défices orçamentais apenas contribuirá para que essa dívida aumente, nomeadamente na sua componente pública.

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  9. Caros todos
    As minhas desculpas por chegar atrasado ao debate.
    «"Dizer que os problemas orçamentais geraram a crise é um delírio." Dito assim é.
    Mas o que deve ser dito é que o impacto da crise financeira internacional em Portugal ("a nossa crise") resultou e agravou-se devido ao acumular progressivo de dívida externa.»
    Sim, isso é verdade. É falsa a tese de que Portugal tenha um problema económico central no seu défice orçamental. Mas é verdadeira, parece-me, a ideia de que temos um problema absolutamente central de falta de competitividade internacional, logo de défice comercial; o que, acumulado, dá dívida externa a mais. Isso sim, já é verdade. Os anos que levámos amarrados ao Euro, e o facto de continuarmos amarrados a ele, só fazem agravar esse estado de coisas. Proceder a uma desvalorização competitiva não é panaceia, pois não, há muito mais a fazer (políticas industriais diferenciadas, etc.). Mas é uma parte - e uma parte, parece-me, neste momento já absolutamente incontornável - do possível processo de cura.
    O dinheiro fiat ajudou a iludir os problemas, sim. Não vem aí nenhum "fim do mundo na nossa cama habitual" em que o dinheiro fiat vai colapsar de todo, isso é falso. Mas a vida pôs-se, sim, mais dura para os devedores. Mais uma razão para proceder a intervenção a sério na actividade bancária e a controlo de capitais (nacionalização da banca? pensemos nisso a sério; recordemos que o fundamento do tal fiat é a soberania). O que aliás correrá em paralelo com o default e a tal saída do Euro...
    Tudo aponta, pois, para o tal Plano B. Só não percebo, sinceramente, de que é que continuamos à espera...

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  10. Finalmente vejo marxistas que pensam com os pés assentes na terra. Afinal o endividamento pode ser um problema e o crédito fácil foi improdutivo. Assim é possível discutir, Agora dizer que o endividamento excessivo não representa qualquer problema é delirante. Muito bem.


    Jorge Rocha

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  11. António Carlos não é marxista e fez um demonstração poderosa, mas os outros tiveram intervenções interessantes.
    João Carlos Graça, peço-lhe desculpa por não lhe ter respondido no outro dia.


    Jorge Rocha

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