domingo, 21 de novembro de 2010

O balde furado ou a pregação aos peixes graúdos


Não há manual de economia adoptado nas nossas faculdades que não conte a história do balde furado para ilustrar aquilo a que chamam o “trade-off” equidade-eficiência.

Era uma vez alguém que quis tirar rendimento aos ricos para dar aos pobres. Encheu um balde com o rendimento dos ricos, desceu a ladeira e quando o ia despejar no tanque dos pobres descobriu que o balde já não estava cheio. Observando atentamente o balde descobriu que estava furado e que parte do rendimento dos ricos havia escorrido ladeira abaixo em puro desperdício.

Porquê? São os incentivos, estúpido. Com menos rendimento os ricos reduzem o enorme esforço que sempre fazem, e com rendimento “caído do céu” muitos pobres preferem não trabalhar.

Moral da história. Até podes preferir mais equidade dada a tua formação moral, mas nesse caso tens de te preparar para ver “o bolo” diminuir. Mais equidade é menos eficiência – o tal “trade-off”. Não seria mais sensato esperar que o bolo cresça mantendo a distribuição como está para depois o dividir?

Como seria a história do balde furado quando o balde serve para transferir rendimento dos pobres para os ricos, ladeira acima?

Com menos rendimento as classes populares consumiriam menos (o crédito ao desbarato acabou-se, não é?), com o consumo dos pobres retraído os ricos deixariam de investir para produzir “coisas úteis” e aplicariam os seus rendimentos em títulos de propriedade e de dívida sem que isso correspondesse a investimento que cria emprego e produz “coisas úteis”. O aumento do “investimento” em títulos esquisitos faria aumentar o valor de mercado destes títulos tornando ainda mais apetecível o investimento em títulos esquisitos. De vez em quando o rebentamento de uma bolha destruiria o valor dos títulos esquisitos, fazendo despejar o balde. Oh, afinal o balde está furado.

Moral da história (que também a tem). Se queres “eficiência” vais ter de aceitar menos desigualdade. Como no Brasil, por exemplo.

6 comentários:

  1. Além de que a eficiência só se pode conceber se for transitiva, isto é, se tiver objecto. A invenção do Dr. Gullotin é extremamente eficiente - se o nosso objectivo for cortar cabeças. Se não tivermos esse objectivo, não passa duma geringonça inútil.

    Na mesma, o tal balde: se o nosso objectivo for diminuir a desigualdade, a eficiência estará em tapar-lhe os furos; se for aumentá-la, o mais eficiente é furá-lo ainda mais.

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  2. A desigualdade acentuada parece-me de tal modo desumanizante (para ricos e pobres) que, se necessário, me parece preferível um bolo menor com menor desigualdade.

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  3. A acreditar na tese de The Spirit Level, a sua preferência moral tem nos factos uma forte sustentação pragmática.

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  4. A questäo dos bolos é que...

    Os ricos nórdicos se calhar até säo mais ricos que os ricos mediterränicos, mesmo pagando mais impostos e melhores salários. Ahn? Pois, em vez de ficarem com 90% da riqueza e depois terem de pagar a seguranças para näo os roubarem, estarem com medo de greves, andarem em estradas miseráveis, terem de ir ao estrangeiro ao médico ou para lá mandar os filhos estudar, ficam só com 80%, e têm paz social, baixo índice de crime, alta produtividade do trabalho, infraestruturas excelentes, saúde e educaçäo públicas ao mais alto nível do Mundo...

    ... aumentar a desigualdade é que faz mirrar o bolo!

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  5. E porque será que o balde tem que estar furado? Não me digam que nenhum aluno colocou essa questão ao professor...
    Como explicação dessa coisa em economês e ainda por cima em inglês, até que está bem ilustrada, mas não passa de uma de tantas estórias que circulam por mail e algumas com uma moral bem mais optimista.
    Se é isto que os manuais de economia ensinam, está explicada a situação actual.
    Afinal precisamos é de funileiros.

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