quinta-feira, 18 de março de 2010

Anatomia de uma crise

O RMF (Research on Money and Finance), acaba de publicar um extenso relatório, do qual sou co-autor, que procura analisar as causas da recente crise da dívida pública nos países periféricos da zona euro. O relatório divide-se genericamente em três partes: causas estruturais da crise (inserção no euro e divergência entre os países da zona euro); causas conjunturais (crise financeira e comportamento subsequente do BCE e dos grandes bancos europeus); discussão das alternativas políticas.

Em suma, este longo trabalho aponta responsabilidades a uma arquitectura institucional europeia desadequada, favorecedora da competição dos diferentes países através da compressão dos salários dos seus trabalhadores e da deterioração das suas condições de trabalho. A Alemanha, embora com resultados macroeconómicos muito medíocres, tem estado à frente nesta corrida para o fundo, acumulando excedentes externos que têm como contraponto os défices de países como a Grécia e Portugal. Os excedentes foram entretanto “reciclados” em crédito bancário aos países da periferia. Estes problemas estruturais foram exacerbados pela crise de 2007-09 e a subsequente actuação do BCE, que correu a salvar os bancos europeus, mas fecha hoje os olhos aos ataques especulativos de que países como Portugal e a Grécia são alvo.

Penso que vale mesmo a pena ler todo o nosso relatório. Contém informação pormenorizada, sobretudo dos mecanismos financeiros na origem da presente crise. Para oportunas análises do documento, que naturalmente se focam na discussão das alternativas políticas, o The Guardian (aqui) e o Público de hoje (aqui e aqui) publicaram bons artigos.

2 comentários:

  1. Este relatorio é uma vergonha.

    Isto representa o que há de pior na cultura Portuguesa, locus de controlo externo.

    As dificuldades que enfrentamos são culpa nossa? Nunca, são sempre os outros! Aliás, se fosse culpa nossa tinhamos que mudar a nossa atitude, e isso implica trabalhar.

    Não percebo como é que é possivel ter a lata de afirmar que a situação de quase insolvencia em que os PIIGS se encontram, não é culpa dos proprios paises, mas sim da alemanha que obrigou os pobrezinhos dos trabalhadores a aceitar salarios mais baixos.

    Isto é preverter a verdade. Em primeiro lugar, independentemente das variaveis externas, ninguem obrigou os governos dos PIIGS a endividarem-se e esbanjarem até um nivel absolutamente insustentavel. Dizer que o endividamento não é culpa deles, é o mesmo que dizer que alguem que se endivida para comprar carros e televisões e depois não consegue pagar as dividas é uma pessoa responsavel, e que a culpa é do banco que lhe emprestou o dinheiro.

    Em segundo lugar, a pressão sobre os salarios dos trabalhadores, não se aplica a todos os trabalhadores. Aplica-se apenas aos trabalhadores não qualificados, que são de facto a maioria. E a razão porque os trabalhadores não qualificados ganham cada vez menos, é porque na economia actual este tipo de pessoas são praticamente inuteis, pois as maquinas fazem a mesma coisa por uma fracção do preço. O mix trabalho/capital utilizado na produção depende do preço relativo destes factores. Ora com os avanços tecnologicos, o capital tornou-se muitissimo mais barato que o trabalho não qualificado, e isto é uma tendencia que se mantem e continuará no futuro. Como se este problema não fosse suficiente, os paises ocidentais, tradicionalmente mais desenvolvidos estão a perder mercado à velocidade da luz para as economias emergentes que beneficiam de um factor trabalho não qualificado muito mais barato.

    Ora, neste enquadramento, só resta duas alternativas aos paises que querem competir na economia actual, ou reduzem os custos dos factores de produção (ou seja reduzem o custo do factor trabalho, uma vez que o capital tem mobilidade global), OU ENTÃO INVESTEM NO AUMENTO DA PRODUTIVIDADE DESTES FACTORES.

    A alemanha decidiu reduzir os custos do factor trabalho, o que no curto prazo é a unica medida possivel pois aumenta a utilização do factor trabalho (reduzindo o desemprego) e aumentando a competitividade do pais. Tambem estou de acordo que nem a alemanha, nem nenhum outro pais europeu, esta a fazer o suficiente para aumentar a produtividade dos factores e reduzir o excesso de oferta de mao de obra não qualificada. Mas isso é um erro que vai prejudicar os alemaes.

    Já quanto aos PIIGS, os seus governos não fizeram nem A nem B, não reduziram os custos dos factores nem aumentaram a sua produtividade, simplesmente decidiram não fazer nada e continuar a gastar principescamente. Isto não é culpa da alemanha, é culpa dos governos corruptos e irresponsaveis que temos.

    A unica razao porque a alemanha tem o excedente comercial que tem, é porque é porque tem muito mais produtividade do que a maior parte dos outros paises. É obvio que a abertura dos mercados beneficia muito mais as economias mais desenvolvidas e mais produtivas, do que as economias perifericas. É precisamente por isso que foram instituidos os fundos de coesão. Sim, aqueles que os PIIGS andaram a esbajar durante anos.

    Concluindo, ainda que existam condições externas desfavoraveis, a culpa da situação em que os PIIGS se encontram, e em particular Portugal, é exclusivamente dos seus governos, que nada fizeram, e nada fazem, para aumentar a produtividade dos seus paises.

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  2. "If productivity is to be set on an upward path, peripheral economies must be weaned away from consumption, low savings, individual borrowing, low investment and speculative bubbles. Structural change requires public mechanisms that could mobilise available resources for investment. It also requires transforming education by committing additional resources and expanding its reach to the poorest. Improving education would, in time, produce gains in labour skills, thus also benefiting productivity. It is apparent that structural change od this order cannot be undertaken using the present inefficient and corrupt mechanisms of state."

    Isto é tudo verdade, mas para fazer isto não é necessário sair do euro, nem nacionalizar metade da economia. Nem sequer é preciso gastar mais dinheiro e endividarmo-nos mais.

    O que é preciso fazer é investir num sistema de educação de qualidade e acessivel a todos e criar fortes incentivos para as pessoas adequerirem mais qualificações.

    O que é preciso é criar um sistema de segurança social que não só preste serviços de apoio social mas tambem de requalificação da população activa. E que preste todos estes serviços em genero e nunca em dinheiro, porque se damos dinheiro as pessoas, estas não têm incentivo nenhum para largarem a mama do estado.

    O que é preciso é um sistema de justiça que funcione rapida e eficazmente e que dê garantias de estabilidade às pessoas e às empresas para que possam poupar e investir com confiança.

    O que é preciso é um governo transparente e responsavel que não esbanja dinheiro, que não emprega centenas de milhares de pessoas que não necessita, que não "investe" dinheiro em projectos que não cabem no âmbito do estado, que não se mete em parcerias publico privadas, etc...

    Concerteza, que um estado que controla os monopolios naturais e que detem uma posição raíz em industrias chave (telecoms, banca, correios, etc...) com vista prevenir falhas de mercado e promover externalidades positivas, está melhor posicionado para mobilizar recursos para o investimento, é vital que assim seja, mas apesar disto o factor mais importante de desenvolvimento é sempre a aposta na qualidade da educação.

    E a titulo de conclusão, volto a repetir, todos os problemas que acima enunciei não são responsabilidade da alemanha nem das vicissitudes da união monetaria europeia, são responsabilidade do governo Português.

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