É um lugar-comum dizer que a política do controlo do défice tem dominado o debate económico durante os últimos anos. Mas talvez seja mais rigoroso dizer que o défice das contas públicas tem sido usado, aliás muito selectivamente, para impôr um conjunto de políticas recessivas ao nível da contracção do investimento público, da redução da despesa social, das privatizações, etc.
Na realidade, nenhuma das forças que colocam o défice no topo das suas prioridades tem defendido medidas de aumento da receita, que também agiriam positivamente sobre o défice (tributação sobre mais-valias, banca, etc.). Têm, aliás, proposto reduções fiscais sobre reduções fiscais, sempre sobre as empresas, bem entendido.
Isso mostra que a questão, mais do que o défice, em que, aliás, a direita teve uma prestação lamentável, é outra: trata-se aí de encontrar um argumento imperativo (agora reforçado com a estratégia de alarmismo e intimidação apoiada nas agências de rating, que a direita faz os possíveis para credibilizar) para executar políticas de redução da despesa com vista desmantelamento do estado social e de políticas económicas públicas. O problema da Direita não é o défice, são as políticas públicas. É isso, aliás, que a Direita reconhece quando critica qualquer redução do défice que não seja alcançada estritamente pela redução da despesa.
O que é preciso ter claro é que a vitória ideológica da Direita no debate ideológico sobre ajustamento orçamental impõe uma política de combate ao défice em que os instrumentos minam os seus próprios objectivos. A contracção do investimento público e políticas públicas de apoio à economia e a própria política de distribuição de rendimentos, mesmo quando reduzem o défice no curto ou curtíssimo prazo, criam as condições para mais défice no futuro (menor crescimento, mais desemprego, menos receita fiscal sobre lucros, trabalho ou consumo, mais prestações sociais, etc.) através de um ciclo vicioso que tem sido o retrato da evolução da economia europeia.
Um discurso que coloca o crescimento e o emprego no centro de todas as políticas não é, portanto, um exercício de populismo virado contra gente séria e ideologicamente descomprometida, que quer impor alguns sacrifícios temporários em nome do bem comum. Esta narrativa, que povoa o discurso económico ortodoxo, esbarra numa dura realidade. Nem os sacrifícios se revelaram temporários, nem o bem se revelou comum.
A redução do desemprego é a política que reduz estruturalmente o défice, porque é a política que pode gerar ciclos virtuosos no conjunto das principais variáveis económicas: aumento de salários, consumo, actividade económica, crescimento, receita fiscal, etc. Esta política faz-se com constrangimentos orçamentais? Faz, sim, senhor. Mas primeiro é preciso ter claros os objectivos, para depois descobrir os melhores meios.
É por isso que uma política fiscal corajosa (sim, receita), muito em particular sobre o Sector Financeiro, é absolutamente decisiva, necessária e nenhum dos fantasmas do costume deverá impedir a sua plena concretização. É uma política que faz a diferença entre os campos políticos. Para quebrar o ciclo da recessão, são necessárias políticas públicas e essas políticas precisam de financiamento.
Isto não quer, obviamente, dizer que a esquerda se ponha fora do debate sobre a despesa e a qualidade da despesa, como foi algumas vezes a tentação. Mas isso é assunto para outro post.
As agências de rating são completamente incompetentes e parciais. Os seus pareceres nem sequer são dignos de serem lidos, são uma perda de tempo.
ResponderEliminarA competência e imparcialidade reside nos membros deste blog! Eles deveriam ditar os rates do nosso país!
Enquanto não houver uniformizaçao das políticas fiscais na UE, o Estado português nunca conseguirá por si só ter força perante a Banca e o sector financeiro em geral.
ResponderEliminarO problema é que, segundo hayek, o Estado tornava-se predador, então liberalizou-se e economia.
ResponderEliminarAs empresas passaram a ter mais poder que os Estados, passaram as empresas a ser predadoras. E pior, nós não votamos nestes novos governos que nos governam...
Concordo com esta perspectiva de controlo do défice como meio, utilizado pela Direita, para reduzir o Estado.
ResponderEliminarSem dúvida que a este debate subjaz a diferença entre Esquerda e Direita como nos diz com absoluta propriedade.
Tem, também, toda a razão quando afirma que é necessário uma política fiscal exigente sobre os meios financeiros para evitar engenharias ludibriantes e mecanismo, simultâneo, de estímulo às políticas e investimentos públicos.
Não longe desta sua perspectiva está o meu último texto intitulado "Econometria e cultura - breves considerações sobre a obsessão mundial com a econometria".
Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt
Controlar o deficit e ao mesmo tempo promover o crescimento,sobretudo no sector de produção de bens e serviços destinados á exportação,e consequentemente aumentar o emprego,parece-me um exercicio complicado.A melhor distribuição do rendimento e uma justa politica fiscal é um imperativo moral,mas não resolve o problema da baixa taxa de crescimento da economia,e sem isso acontecer não aumentam as receitas do Estado nem diminue a dependencia externa e a divida.O investimento público não é tudo,qual a razão para que não exista investimento privado?.Não é só Portugal e a Grécia com as devidas diferenças que tem dividas externas elevadas,mais paises da zona euro estão nas mesmas circunstancias,só que tem um peso politico e economico superior ao nosso.Se esses paises negociarem junto da CE um prazo mais dilatado para reduzir o deficit o que é o mais provável nós vamos por arrasto,mas se isso não acontecer a nós mimguem nos dá nada.Discordo da forma como alguns partidos á esquerda falam na obsessão do deficit e culpam só o governo por tudo e mais alguma coisa,no fundo as questões são mais complicadas,mas explicá-las não rende votos.
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