João Pinto e Castro e Carlos Santos, dois economistas que sigo com toda a atenção, convergem com a análise de João Ferreira do Amaral, aqui citada, sobre as necessárias alterações na arquitectura do governo económico europeu. Pinto e Castro sugere um debate na AR. Proposta interessante: estou convencido que BE, PCP e uma parte do PS (minoritária?) convergiriam no diagnóstico e nas propostas. Se calhar teríamos surpresas noutras bancadas?
No entanto, a coisa está muito bem trancada a nível europeu. O Tratado de Lisboa, agora aprovado pelo bloco central europeu, só consolida os “dogmas neoliberais que informaram Maastricht”. É por esta e por outras que estou muito pessimista e não vejo como o que designei por paradoxo europeu possa ser politicamente superado (intelectualmente, a coisa é mais fácil...): A história indica que o liberalismo económico tende a destruir o mercado porque não consegue vislumbrar os seus limites, nem pensar em políticas e instituições que contrariem a miopia dos interesses capitalistas. As elites europeias, obcecadas com a construção do mercado interno, esqueceram-se a certa altura disto.
E esqueceram-se que um mercado interno equilibrado não é compatível com a compressão sistemática do crescimento dos salários, fruto de políticas públicas que fragilizam os assalariados, e com o aumento da desigualdade regional, fruto da quase ausência de mecanismos redistributivos à escala europeia. E não é compatível com a estratégia da economia dominante – a Alemanha – que seguiu a via não-cooperativa de assentar o seu crescimento nas exportações: os excessivos excedentes de uns são os excessivos défices de outros. O drama é que estas questões, que são uma das chaves da dependência externa da economia portuguesa, não entram sequer na discussão pública sobre economia, dominada que está pela tribo dos economistas-2012 e pelo seu lugar-comum da "competitividade" obtida à custa do sacrifício dos salários, da saúde e da vida fora do trabalho. De alguns, claro.
Nos anos 80 o dinheiro começou a chegar aos montões a Portugal, muitos se alegravam, outros interrogavam-se de onde vinha todo aquele dinheiro, outros diziam: os alemães fornecem essas remessas, mas os portugueses devolvem isso tudo em compras de carros,etc. É isto que este poste também nos vem dizer, por mãos conhecedoras!
ResponderEliminar"que seguiu a via não-cooperativa de assentar o seu crescimento nas exportações: os excessivos excedentes de uns são os excessivos défices de outros"
ResponderEliminar.
É o destino inexorável de todas as sociedades demograficamente envelhecidas, ficam prisioneiras das exportações.
«convergem (...) sobre as necessárias alterações na arquitectura do governo económico europeu»?
ResponderEliminarPelo menos no texto do Carlos Santos, não vi nada sobre a "arquitectura" do governo económico. Vi sobre as políticas, isso vi e concordo.
Este ponto é essencial. O João Ferreira do Amaral, por exemplo, reincide muitas vezes na confusão entre as políticas europeias estarem erradas e a própria UE ser um erro. O que equivale a algo como dizer que, se a Constituição permite (sublinho, permite) políticas erradas, o que há a fazer é mudar a Constituição. (Essa é grosso modo a técnica do AAJardim.) E até pode ser necessário em alguns casos. Mas não é o caso geral, porque são níveis diferentes.
As políticas europeias são o que são por haver uma certa maioria política na Europa há muitos anos, incluindo as distracções dos partidos social-democratas (ou socialistas) incapazes de gizar alternativas. Mas aí, em focar aí a questão e em dar luta nesse ponto, é que está a discussão. Tudo isso fica inquinado, a meu ver, quando se usa a matéria para alimentar um discurso anti-UE por princípio, no qual eu vejo grandes riscos. E que considero fundamentalmente retrógrado.
Daí me parecer útil não confundir as coisas se realmente queremos fazer avançar esse debate.