sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Repetir para mudar de conversa

"José Adelino Maltez disse, na SIC Notícias, uma daquelas certezas ideológicas que se arriscam a tornar verdade apenas por serem muito repetidas: que a corrupção é tanto menor quando menos Estado houver (e vice-versa). A minha pequena contribuição para o debate: entre os países com menor corrupção estão a Dinamarca, a Suécia, a Finlândia, a Islândia e a Noruega. Exemplos de economias e sociedades com pouca presença do Estado, supõe-se. Entre os países com mais corrupção estão o Haiti, o Iraque, o Sudão, o Afeganistão e a Somália, onde, como se sabe, o Estado é omnipresente." Daniel Oliveira no Arrastão.

A minha pequena contribuição para o debate passa por divulgar investigação sociológica recente que indica que os países com maior desigualdade económica são também aqueles onde é maior a corrupção. A injustiça social torna a comunidade política uma miragem, corroendo a legitimidade das regras e dificultando a existência de movimentos cívicos robustos e de uma cidadania atenta e interventiva, uma das melhores formas de dificultar a corrupção. Em Portugal, fomos apanhados numa armadilha social, feita de elevados níveis de desigualdade e dos correspondentes baixos níveis de confiança social, da qual não conseguimos sair espontaneamente.

Em Supercapitalism, Robert Reich desenvolve um argumento de economia política interessante para este debate: a intensificação das pressões concorrenciais levou as grandes empresas a procurar influenciar ainda mais o inevitável processo político de estruturação das «regras do jogo» nos mercados em expansão. Conseguem desta forma alcançar condições mais vantajosas para os seus negócios, que passaram a depender cada vez mais da forma como os arranjos de mercado são definidos (e eles têm de o ser sempre...).

Não é de admirar que o processo político de expansão dos mercados ou a entrada das empresas privadas em áreas onde os mercados concorrenciais não passam, apesar da enganadora retórica dominante, de uma ficção, tenha originado um incremento generalizado do investimento das empresas e dos capitalistas no processo político, traduzido, nos EUA e não só, num exponencial crescimento dos grupos de pressão e do financiamento privados e num aumento das oportunidades para a corrupção.

6 comentários:

  1. "... fomos apanhados numa armadilha social, feita de elevados níveis de desigualdade e dos correspondentes baixos níveis de confiança social, ..."

    Que a desigualdade existe e tem aumentado, ninguém de boa fé duvida.
    Estabelecer um nexo de causalidade entre desigualdade social (causa) e corrupção (efeito) é "uma daquelas certezas ideológicas que se arriscam a tornar verdade apenas por serem muito repetidas".

    Porque, se assim fosse, os corruptos seriam por necessidade, a corrupção seria pequena e média, os ricos seriam incorruptíveis por não serem vítimas mas algozes da injustiça social.

    E não é nada assim.

    Há, sem dúvida, um ambiente propício à pequena corrupção em sociedades socialmente deprimidas mas é, sobretudo, a grande corrupção que come o bolo quase todo e dá o exemplo, o sinal, que os mais pequenos podem subtrair também umas migalhas.

    Em países onde a prática da corrupção é passaporte incontornável para os grandes contratos quem é que abocanha? Os senhores que detêm o poder de decidir.
    A corrupção não decorre da desigualdade social; a corrupção aumenta a desigualdade social.

    Mais Estado ou menos Estado tem pouco significado neste caso. O Estado pode ter um perímetro reduzido mas os grandes negócios são dominados por uma clique que detém o poder e está em posição de roubar em proveito próprio e, deste modo, espoliando os seus súbditos. O perímetro é reduzido à massa crítica onde a corrupção vale a pena.

    Mas é inquestionável que a prática da corrupção passa de forma esmagador pelos negócios com os tutores do Estado, directa ou indirectamente. O Estado, enquanto entidade abstracta está, neste e em muitos outros casos, sujeito à disputa de interesses por parte daqueles que o tutelam.

    E, neste sentido, quanto mais Estado (não em área mas em massa crítica), mais corrupção.

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  2. Mas afinal qual é a definição de corrupção? É actuar sem respeito pelas leis? Uma boa definição é indispensável a fim de sabermos do que falamos.

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  3. Caros Bloquistas,

    Quando vêm a Rio de Moinhos (freguesia do concelho de Aljustrel)??? É vergonhosa e à medida que a população vai descobrindo até escandaloso que a candidatura do BE tenha sido um instrumento usado e preparada pelo próprio PCP para ganhar as eleições nesta Freguesia. Venha agora o Francisco Louçã ouvir e auscultar o que a população pensa da candidatura do BE.

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  5. Muitas desigualdades hoje existentes foram cavadas pelas centrais sindicais. Com excepção de um período logo a seguir ao 25 de Abril, há dezenas de anos que os aumentos reclamados pelos sindicatos nas empresas são em valores percentuais para toda a gente, quer ganhe 500 ou 5000 euros. Ano após ano com a aplicação desse sistema esse factor foi dos que mais contribuiu para os desníveis salariais.

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