terça-feira, 22 de setembro de 2009

Incertezas para as legislativas I

As sondagens apontam para uma vitória do PS ou do PSD, sobretudo do primeiro, sem maioria absoluta. Apontam ainda para um crescimento dos partidos à esquerda do PS. Mas o elevado número de indecisos torna todos os cenários possíveis. Há dois dados de especial relevo. Primeiro, muitos dos eleitores que admitem ainda mudar o sentido de voto são potenciais votantes do BE. Segundo, é também entre estes que muitos dizem ser mais importante “pensar nas consequências do voto para a formação do governo” do que “votar de acordo com as simpatias e proximidades ideológicas”. Ou seja, muito dos potenciais eleitores do BE dão bastante importância à produção de soluções governativas. Logo, caso se vislumbre como totalmente improvável o BE contribuir para tais soluções, então as votações na “esquerda radical” poderão ficar uns furos abaixo do estimado...

A rejeição da maioria absoluta resulta do exercício musculado e pouco dialogante do poder nesta legislatura, da penalização da inflexão centrista do PS e da crise económica. Sobretudo desde a estrondosa derrota nas europeias que os socialistas se apresentam mais propensos ao diálogo e piscando o olho à esquerda. Mas esta mudança é para muitos demasiado tardia e não congruente com a actuação de um governo que passou a legislatura a combater os sindicatos, apesar de alguns acordos na concertação, a passar a ideia de que “só se fazem reformas contra os profissionais” que as irão executar, a descapitalizar alguns dos melhores serviços públicos (veja-se o que se passou no ensino superior) e a fazer da “esquerda radical” a sua bête noire.

Se PSD e CDS juntos conseguirem maioria absoluta, a governabilidade estará, em princípio, assegurada: a última coligação foi suportada por uma maioria coesa, numa conjuntura difícil, e o seu colapso resultou da acção presidencial. Se ganhar, tal dever-se-á não tanto a uma adesão recente dos portugueses às ideias de recuo do Estado social mas antes à rejeição do governo incumbente. Todavia, poderá existir alguma adesão à prudência quanto ao endividamento do país, bem como à necessidade de uma política menos centrada na produção de estatísticas a qualquer preço e, nesta exacta medida, uma certa adesão à “política de verdade”. Tudo junto, e somado a uma certa incapacidade de Leite em capitalizar com a dinâmica das europeias, será porventura insuficiente para uma maioria de direita.

O PS, por seu lado, está só no seu labirinto. Em 2004, altos responsáveis do partido (todos os que apoiaram a candidatura de Alegre nas primárias) defendiam que, em caso de maioria relativa, deviam ser envidados esforços de entendimento entre as esquerdas. O que mudou? Exceptuando algum acentuar do esquerdismo (vide o programa de nacionalizações), alias simétrico da inflexão centrista do PS, BE e PCP continuam iguais a si próprios... Pelo contrário, o PS apostou na estratégia “Sócrates (e a maioria absoluta) ou o caos”. Estão agora num beco de difícil saída: se perderem ou tiverem uma maioria muito relativa, o partido poderá afundar-se com o líder. Haverá sempre a hipótese de entendimento com o PSD, que aliás aprovou a maioria das suas iniciativas legislativas (SOL, 16/5/09), mas Leite não parece coadunar-se bem com Sócrates (e vice-versa). Esta solução agravaria a já pronunciada falta de clareza das alternativas ao centro. E não garante estabilidade: o “bloco central” durou menos do que a coligação PSD-CDS. Há ainda a possibilidade de um governo minoritário, mas será sempre também uma situação de instabilidade potencial.

(continua)

Artigo originalmente publicado no Público de 21/9/2009

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