Os comentários às minhas postas (I e II) sobre o princípio do fim do Euro são reveladores do quanto é difícil a discussão ponderada de um assunto sensível. Admito que o cenário desperte em alguns a emoção do orgulho nacional ferido. Afinal, o País fez importantes sacrifícios para estar no “pelotão da frente” e abdicou de parte da soberania na perspectiva de que o euro seria um abrigo para as tempestades cambiais e um passaporte para o progresso material. E, no entanto, até o fervoroso europeísta Mário Soares admite que a UE corre “o risco de desagregação” (ver aqui).
Um leitor tomou a previsão que apresentei (com fundamentação racional) como uma manobra retórica “para marcar pontos ideológicos”. Outro, como a defesa de uma opção tão anti-europeia quanto a de uma direita nacionalista. Ainda outro, quer saber a minha ‘verdadeira’ opinião. De facto, leituras pouco atentas, irreflectidas, só inspiram comentários precipitados. Em mais do que uma passagem do texto fui bem claro quanto à minha preferência política pelo aprofundamento da integração europeia. Agora, como também disse, um europeísmo lúcido, não-ideológico, exige o uso da inteligência. Em vez de emoções, do que precisamos é de recursos intelectuais para ver os limites da integração europeia e perceber como esta crise a atinge profundamente.
Por isso, na primeira parte da posta partilhei a minha leitura de vários factos ocorridos nas últimas semanas. Não estava à espera que todos concordassem com a minha interpretação sobre a posição da Alemanha mas confesso que me surpreendeu a validação do que escrevi por parte de um compatriota lá residente, pelos vistos culturalmente bem integrado. A sua opinião reflecte com imensa clareza o nacionalismo económico e o apoio a políticas recessivas hoje dominante no eleitorado alemão. Ao que parece, o país recusa ver a realidade: quebra dramática do PIB, dependência do resto da Europa para parte importante das suas exportações, quase falência de uma parte do sector bancário. Joschka Fischer tem mesmo razões para estar preocupado. E nós também.
Complementando o texto de 2006 de Jacques Sapir que referi em (II), remeto os leitores para a análise da situação actual na Zona Euro feita pelo economista Patrick Artus (aqui) e também para este texto por ser tecnicamente acessível.
Admito que muitos leitores não tenham uma ideia do que vai acontecer durante o próximo ano. Na linha do que defendem os economistas da SEDES, o governo eleito em Setembro, tal como na Irlanda ou na Grécia, vai conduzir uma severa política de austeridade tendo em vista convencer os fundos de investimento (intocáveis executores da disciplina do mercado) de que não vai falhar no serviço da dívida. É que, com o passar do tempo, esta vai aproximar-se dos 100% do PIB, a marca da venda da dívida apenas a juro proibitivo.
Também irá apoiar as empresas expostas à concorrência mundial que procurem impor cortes salariais para recuperarem alguma competitividade-custo perdida nos últimos anos, sem o que não conseguem travar no imediato a perda de quotas de mercado. Em consequência destas medidas no sector público e privado o País verá agravada a sua recessão. Como quase toda a Europa vai adoptar esta política económica , a crise tornar-se-á social e politicamente insustentável. Mais ainda, a Europa não apoiará os EUA nos seus esforços de saída da crise ficando a Alemanha suspeita de querer sair desta recessão global “à boleia” dos programas de estímulo à economia lançados pela administração Obama.
A crítica imediata a esta política de recessão social apontaria uma alternativa à brutal redução de salários: promover o crescimento das exportações com base em inovação tecnológica e organizacional. Porém, o alargamento significativo do número de empresas que adoptam estratégias de inovação eficazes exige outro horizonte temporal. As actuais políticas de inovação devem certamente ser revistas mas os resultados não são para o curto prazo, muito menos para a emergência financeira que vamos viver. Como disse Krugman a propósito da Espanha, "isto vai ser feio."
Assim, a manutenção de Portugal na Zona Euro (enquanto esta durar) implica a decisão política, ainda que implícita, de sofrer um prolongado período de grande desemprego. E isto sem que o sacrifício valha a pena porque o nível de vida apenas subirá sustentadamente com o aumento da produtividade e os processos sociais que permitiriam esse aumento, através do investimento e da inovação tecnológica, são prejudicados pelas políticas de austeridade.
Depois das eleições os portugueses vão ver o que é austeridade e não sei se a arquitectura de governação saída do 25 de Abril aguentará.
ResponderEliminar.
Se os irlandeses andam a cortar forte e feio por causa de €400m de euros que pedem emprestados todas as semanas, só as eleições impedem que em Portugal não se faça o mesmo quando se pedem emprestados cerca de €340m por semana. Certo é que os irlandeses são pouco mais de 4m e pagam taxas de juro mais elevadas.
Sabendo que um blogue não é uma mercearia onde se pede o que se quer, arrisco: Por que não fazer uma breve descrição do que representará para os portugueses a saída de Portugal do euro?
ResponderEliminarhttp://www.thestandard.com.hk/news_detail.asp?we_cat=16&art_id=85008&sid=24627766&con_type=3&d_str=&fc=1
ResponderEliminar"For whatever reason, the Germans lately hold the absolute leadership when it comes to purchasing gold bullion.
For comparison, the French bought only 1.1 tonnes of gold during the same period.
On the back of such solid demand for gold investment, fully automatic gold vending machines, the size of a phonebooth and shaped as a gold bar, have even been set up recently in German railway stations.
So, with German citizens suddenly buying about 55 times more gold than the citizens of their direct neighbor and second largest economy in Europe, France, we should probably wonder, whether (A) the Germans have gone crazy or (B) they may know something that others don't.
It turns out that Germans are simply buying gold because they aim to rescue their savings by converting funds on their bank accounts to gold bars, after it has been admitted by the German banking regulator BaFin that the country's financial system was only minutes away from total collapse last autumn."
"...Assim, a manutenção de Portugal na Zona Euro (enquanto esta durar) implica a decisão política, ainda que implícita, de sofrer um prolongado período de grande desemprego. ..."
ResponderEliminarEscreve isto é ter implícito que sair da área do euro facilitaria o combate ao desemprego. Isto é falso.
As taxas de juro aumentariam consideravelmente, o peso da dívida seria bem maior e a política orçamental teria de ser ainda mais restritiva. Será tão difícil perceber isto?