Um dos aspectos fascinantes da actual crise económica é ver muitos dos liberais de sempre - incluindo Sarkozy, Merkel, Barroso, entre muitos outros - a defender o regresso em força do Estado, jurando a pés juntos que a intervenção deste é fundamental para controlar os ímpetos destrutivos das forças de mercado. Para aqueles que, como os autores deste blog, andam há anos a apontar as limitações dos argumentos liberais, estes são momentos algo confortantes (e até risíveis). Mais ainda, a sucessão de discursos vindos de partes inesperadas acerca das razões desta crise e das soluções necessárias para a combater, levam a crer podermos estar perante a possibilidade de avanços substanciais no que respeita à possibilidade de um maior controlo democrático do funcionamento dos mercados, o qual contrarie as tendências centrais da evolução do capitalismo nas últimas décadas - aumento das desigualdades, instabilidade crescente, crescimento anémico, desemprego.
Como sugere o Jorge no post anterior, a história ensina-nos que foi em momentos de crise aguda que as alterações institucionais mais profundas ocorreram. Mas é preciso termos em conta que essas alterações tanto podem ser no sentido do New Deal de Roosevelt como na chegada ao poder do Partido Nazi na Alemanha, para usar dois exemplos históricos concomitantes. A necessidade de mudanças profundas, quando existe, tende a ser aproveitada por quem consegue mobilizar as forças sociais relevantes. No momento actual, nem a crise atingiu proporções de ruptura (embora os sinais que nos vão chegando sejam cada vez mais preocupantes para os tempos que aí vêm) - nos EUA teme-se que o desemprego chegue aos 10%, no auge da crise de 1929 atingiu 25% da força de trabalho - nem é nada claro que as forças no terreno favoreçam as causas da esquerda.
No plano internacional, a administração Bush não surge isolada na defesa da lógical liberal de funcionamento do sistema financeiro internacional. Sendo ainda cedo para perceber quão longe irá a reforma do sistema que sairá da cimeira do G20 em Março, não é de esperar, pelo menos para já, que dela emerja a decisão de uma regulação global do sistema financeiro que evite a concentração mundial das poupanças num número reduzido de mãos e que permita colocar o sistema financeiro ao serviço da economia real (em vez do inverso que hoje se verifica).
Também na Europa não sabemos em que resultará a crise. Alguns esperam que ela torne clara a necessidade de uma gestão coordenada das políticas macroeconómicas ao nível da UE. Certos autores apostam mesmo que este será o momento para introduzir mecanismos permanentes de gestão dos ciclos económicos ao nível europeu (como temos defendido insistentemente neste blog e que são discutidos com maior detalhe neste artigo que o João e eu publicámos no LMD), ou pelo menos a utilização de instrumentos pontuais, como a emissão de obrigações europeias para financiar projectos de investimento à escala transnacional, que podem constituir precedentes importantes numa arquitectura institucional que torna a UE actual num motor fundamental do neoliberalismo. Mas também do lado do adversário há quem não perca tempo: do think-tank Bruegel (cujo presidente é conselheiro económico de Barroso) estão a sair propostas de uma resposta forte e determinada à crise... sob a forma de redução do IVA acompanhada do reforço dos compromissos com as 'reformas estruturais' (leia-se, resregulamentação, liberalização, privatização) por parte dos países cujo défice público ultrapasse o limite de 3% do PIB devido à quebra das receitas associada (ou seja, quase todos).
Em suma, o momento é de combate político e ideológico e o desfecho está longe de estar determinado. Não é tempo para a esquerda ficar sentada no sofá.
O desfecho está mesmo muito longe de estar determinado. Como Naomi Klein muto bem documenta no seu livro"A doutrina de choque", a Direita tem sido pródiga na utilização de situações de crise para fazer avançar a sua agenda. Entre muitos exemplos no presente, destaco a tentativa de avançar ainda mais com a desregulação do comércio mundial através da ressuscitação da ronda de Doha. Uma boa leitura é a recente entrevista de Naomi Klein
ResponderEliminarhttp://www.democracynow.org/2008/11/17/naomi_klein_on_the_bailout_profiteers
A esquerda?? A esquerda combate o capitalismo!E defende uma economia sustentada, portanto planificada. O pensamento que domina por este blogue é a ideia social democrata que veio dar no que que está.
ResponderEliminarSó os trabalhadores podem vencer a crise!
A luta de classes existe e só pode ter um vencedor, o povo escravo!
Viva o marxismo/leninismo!