quinta-feira, 6 de março de 2008

A tragédia portuguesa em dois actos

Duas notícias no Público de ontem dizem tudo sobre a tragédia da economia portuguesa: «ministro sustenta prioridade ao défice mesmo que afecte crescimento» e «consumo europeu ao ritmo mais lento em cinco anos condiciona exportações nacionais». Cada um dos países europeus procura que a dinamização das exportações seja o motor do seu crescimento. O processo é altamente descoordenado. O resultado global só pode ser perverso: um mercado europeu desnecessariamente contraído por uma orientação de política que depende da sua expansão. Exportar para fora da UE? Com o Euro a 1,53 dólares? Cada vez mais difícil. Alternativas? Uma política económica de relançamento, coordenada à escala europeia, capaz de dinamizar a procura e de forjar um «jogo cooperativo» no espaço europeu. Os países com situações orçamentais mais folgadas dariam o sinal, mas países como Portugal, com uma economia estagnada há anos, deveriam ter uma margem de manobra muito maior para conduzirem uma política orçamental mais amiga do crescimento e da geração de emprego. Obviamente que isto exigiria governos com orientações menos tributárias da macroeconomia ortodoxa que continua a alimentar o mito de que os problemas do desemprego se devem à «rigidez do mercado de trabalho».

3 comentários:

  1. O João Rodrigues pensa em termos keynesianos. O keynesianismo é uma teoria económica que resolveu a Depressão dos anos 30, a qual se deu numa época em que havia montes de pessoas na miséria, pobres, com muitos filhos, etc. A falta de procura não tinha qualquer explicação que não fosse o mau funcionamento da economia.

    A situação de hoje na Europa é totalmente diferente. A Europa tem uma demografia estagnada, uma população hiper-rica, e a procura está estagnada, não devido a um qualquer mau funcionamento da economia, mas sim devido a que a população não precisa mesmo de mais produtos e serviços.

    Estar a aplicar a esta situação a receita keynesiana, procurando estimular, através da injeção de mais e mais dinheiro (leia-se crédito) na economia, mais e mais procura, é um erro.

    É isso que tem sido feito nos últimos anos: sustentar a economia através de uma expansão continuada do crédito ao consumo, com o objetivo de criar mais e mais procura, por bens cada vez mais fictícios e menos úteis.

    O João Rodrigues, aparentemente, quer mais e mais desta mesma política.

    Luís Lavoura

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  3. Alguns comentários:

    1. A falta de procura (ver posta acima) é causa e consequência do desemprego elevado. Além disso, a extroversão crescente das economias faz com que os salários sejam encarados cada vez mais como um custo. Com resultados macro perversos.

    2. Essa sua ideia de uma Europa "hiper-rica" não é sustentável. Basta olhar para as imensas necessidades e carências por satisfazer nas "bolsas de pobreza" que não só persistem como em alguns casos se alargam.

    3. O sobre-endividamento privado é também o resultado da estagnação salarial. Isso seria atenuado com uma melhor partilha.

    4. Existe, na área do ambiente, da renovação urbana, das infra-estruturas, do apoio à inovação, dos serviços públicos, da educação, dos chamados serviços de proximidade, muito que pode e deve ser feito. Uma estratégia, coordenada à escala europeia, de investimento público que estimule e arraste o investimento privado e aumente a produtividade é mais do que necessária. O estimulo pode ser canalizado para aqui e não necessariamente para "bens cada vez mais fictícios e menos úteis". Aliás só com comando público é que esta reorientação é conseguida.

    5. E depois é preciso não esquecer que o pleno-emprego só se alcança se os governos se dotarem de instrumentos e vontade para evitar crises com uma duração e intensidade desnecessárias. Keynesianismo pois claro.

    6. A esta luz a estratégia europeia é, na nossa opinião, errada.

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