terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Taxa de desemprego III

A minha perplexidade perante este anúncio desviou-me a atenção da, talvez mais grave, associação feita por Vital Moreira entre o recente aumento do desemprego e uma pretensa restruturação económica em curso. Primeiro, como aqui já se explicou, dificilmente a mudança tecnológica pode ser responsabilizada pelo crescimento do desemprego de forma prolongada no tempo. Segundo, não vejo quaisquer sinais de restruturação económica. Quais são os novos sectores dinâmicos e tecnologicamente avançados da economia portuguesa? Parece-me mais que são os constragimentos orçamentais - feitos sobretudo através da redução do investimento público, como, aliás, aponta Vital Moreira - os responsáveis pela actual estagnação económica e consequente crescimento do desemprego.

1 comentário:

  1. Relativamente à tua primeira asserção permito-me uma observação intuitiva (sem pretensões de cientificidade). Parece-me que se em tese a ideia de que a mudança tecnológica acaba por ser acomodada pelas economias poderá ser aceitável (em termos agregados, ao nível do emprego, as perdas em determinadas actividades serão anuladas por ganhos em outras, eventualmente novas, actividades), penso que a velocidade com que a inovação hoje acontece é muito superior à capacidade de absorção das economias - e estou a pensar sobretudo na capacidade de adaptação das pessoas. De modo que do meu ponto de vista, as economias tão abertas quanto a nossa estão em constante processo de "catching up" relativamente às incessantes alterações de contexto com que se vêem bombardeadas. Admito que a inovação tecnológica se processe por ondas, com períodos de ruptura mais evidente e outros de maior continuidade (digamos assim), mas creio que a tendência será para que os momentos de "continuidade" sejam mais curtos e mais frequentemente interrompidos por momentos de ruptura que exijam das pessoas (porque é delas que se trata) sucessivas readaptações.
    Assim sendo, parece-me claro que um equilíbrio "clássico" no mercado laboral (se é que essa "coisa" existe) dificilmente se produzirá - embora possamos viver aqui e ali períodos mais "tranquilos". Penso que enfrentaremos uma proporção cada vez mais elevada de um desemprego estrutural resultante da inadequação da oferta à procura.
    Coisa diferente é dizer que não há soluções que permitam minorar este efeito. É evidente que também considero que o Estado tem um papel estabilizador da procura - o próprio investimento privado ressente-se deste clima de incerteza decorrente da velocidade com que a inovação se processa.
    Mas o papel do Estado não se resume a isso. É necessário que as pessoas tenham um nível educacional que lhes permita lidar com outro à-vontade e confiança com a mudança, que lhes permita absorver a formação ao longo da vida com facilidade e eficácia. Não adianta enterrar rios de dinheiro em formação se o nível educacional de base não permite que ela seja absorvida com eficácia. A aposta na educação é decisiva - e neste aspecto há imenso a fazer neste país, a começar (prioritariamente, digo eu) pelo seu alargamento às idades mais tenras, passando por curricula mais abrangentes (e menos "direccionados" de forma tão precoce).
    Aliás, parece-me que um dos caminhos para o problema do desemprego, a prazo, é a aposta em funções que exijam o contacto humano e sobre as quais repousa o edifício económico (e que para além disso são elementos constitutivos da dignidade humana): a educação, a saúde, os cuidados com os idosos, etc. O papel do Estado é nesta área primordial. Evidentemente que isto implica uma reestruturação interna do Estado mas também que, ao contrário do que parece ser o consenso actual, que este cresça (embora porventura reduzindo o seu papel em áreas menos decisivas).

    Uma nota final para a tua observação quanto aos sinais de reestruturação económica. Vivo perto da zona do Ave e se é verdade que persiste uma parte do tecido empresarial (nomeadamente no têxtil e vestuário) que se baseia nas lógicas de sempre, a verdade é que boa parte dele foi "apagado" do mapa e que em paralelo, há um conjunto de empresas do sector que se modernizaram e se internacionalizaram, de acordo com outras lógicas (qualidade, design, projecção de marca). A verdade é que apesar disso, o saldo líquido, em termos de emprego é claramente negativo - o que contraria um pouco a tua primeira tese. Ainda estamos em processo de ajustamento? É uma questão de procura? Não me parece que essas razões justifiquem tudo...

    Pedro Ribeiro

    ResponderEliminar