Na passada terça-feira à noite, tive o privilégio de participar em mais um comício, com centenas de pessoas, no belo Pátio da Inquisição, em Coimbra.
Tenho de começar esta intervenção com um pedido de desculpas a todas e a todos, em especial a Fernando Teixeira, o incansável advogado do povo deste distrito e a Paulo Raimundo, que tem encarnado como nenhum outro a economia moral da classe trabalhadora deste país.
E tenho de pedir desculpas pelo mau gosto de vos ler um comunicado do Governo de gestão datado de 23 de abril, o mesmo Governo, noto desde já, que recusou promulgar, alegando estar em gestão, o acordo entre a administração da CP e os sindicatos para aumentos salariais tão necessários.
Leio, então, o tal comunicado: “No âmbito do Plano de Defesa Europeu, o Governo português vai solicitar a ativação da cláusula de derrogação nacional. Esta cláusula permitirá estabelecer uma exceção ao cumprimento das regras orçamentais de modo a acomodar o aumento da despesa com a defesa. O Partido Socialista foi ouvido no processo de tomada de decisão.”
Três dias antes, a 20 de abril, um homem bom, o Papa Francisco, na sua última intervenção afirmou: “Não é possível haver paz sem verdadeiro desarmamento”
Neste contexto, aposto que sentis uma “raiva a nascer nos dentes”, como cantou Sérgio Godinho quando perguntava: “que força é essa, amigo?”.
Quem está vivo e vive neste país, quem quer bem ao povo deste país, só pode sentir raiva perante esta pulsão de morte. Mas nós sabemos, cada um de nós sabe, que é coletivamente que superamos a raiva impotente, transformando-a em argumento dirigido, em programa consistente, em força de esperança, em pulsão de vida, agindo com o corpo todo, com a mente toda, sem separações, como tem feito Paulo Raimundo.
Aqui está ele. Aqui estamos nós. Sabemos que somos contra, somos contra o Estado de mal-estar social que nos querem impor, usando o medo e o desperdício da corrida armamentista como meios.
Sabemos que somos a favor, somos a favor do Estado de bem-estar social, assente na satisfação das necessidades populares pelos serviços públicos e prestações sociais, assente nos direitos do trabalho que cria tudo o que tem valor.
Contra a insegurança do Estado de mal-estar, só o Estado de bem-estar gera a segurança que vale à imensa maioria, a segurança social.
O Estado de mal-estar que promove a guerra, a guerra de todos contra todos, é o mesmo que tem promovido a transferência de rendimentos do trabalho para o capital.
No último quarto de século, entre 1999 e 2024, os salários reais cresceram apenas 13,5%, mas a produtividade do trabalho cresceu 20,8%, o que também não é famoso. Seja como for, a produtividade cresceu mais do que os salários reais, o que significou automaticamente uma quebra do peso dos rendimentos do trabalho no rendimento nacional em cerca de quatro pontos percentuais, mais de dez mil milhões de euros que pertencem a quem trabalha.
Por isso, quando Paulo Raimundo fala de forma incessante num choque salarial, está a ser porta-voz, estamos a ser a porta-vozes, da sensatez económica e do tal bem-estar social, a favor dos direitos laborais, contra a inflação de direitos patronais. Somos sempre contra e a favor.
Num contexto de desglobalização, em que os mercados internacionais estão periclitantes, o mercado interno, impulsionado pelo aumento do poder de compra de quem trabalha, é o porto seguro da economia portuguesa.
PS e PSD preferem “espirros salariais”, como bem disse Paulo Raimundo. PS e PSD estão de acordo com o investimento da guerra, mas têm travado o investimento público socialmente necessário, da habitação ao SNS.
Um número: 2,7% do PIB. Só há na UE dois países com percentagens tão baixas de investimento público no Produto Interno Bruto; países como a Suécia ou Eslovénia têm níveis de investimento público mais de duas vezes superiores, em percentagem do PIB. Temos inscrito no programa o firme propósito de alcançar 5% do PIB de investimento público no PIB, valor semelhante ao da Polónia.
Nós queremos um Estado de bem-estar social e eles querem um Estado de mal-estar social. Esta é a diferença essencial.
Sabemos que há dinheiro, que tudo o que queremos fazer, podemos pagar, assim haja vontade soberana com expressão monetária. O constrangimento não é financeiro, nunca foi, como se vê com a corrida armamentista, mas de recursos reais e de poder para os mobilizar.
Haja poder. Haja apoio à CDU, como o que foi dado por mais de meio milhar de cidadãs e de cidadãos sem filiação partidária, no quadro da Iniciativa dos Comuns, subscrevendo um apelo intitulado “os dias levantados”; um apelo que convoca o poeta e militante comunista Manuel Gusmão. Como ele disse: “se o trabalho não é cidadania, a cidadania não é inteira”.
Haja trabalho cidadão, haja CDU. Viva a Coligação Democrática Unitária, viva Portugal.
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