segunda-feira, 11 de outubro de 2010

O atoleiro em que estamos metidos

Nos últimos dias o Banco Central Europeu tem anunciado que vai rever a sua política de financiamento dos bancos, o que representa um aviso aos governos da periferia da UE.

Assim, o esquema lucrativo de pedir emprestado ao BCE a uma taxa de 1% para depois emprestar ao Estado português a uma taxa superior a 6% através da compra da nossa dívida pública parece condenado a acabar. Com menos operações lucrativas, os bancos serão ainda mais selectivos na concessão do crédito às empresas e particulares. Consequentemente, haverá menos crédito de tesouraria às empresas e mais desemprego, o que arrasta mais despesa em subsídios e menos receita fiscal por via da retracção da actividade económica.

A recessão produzida pelas medidas de austeridade será então agravada pela nova política monetária do BCE. A que se pode vir a juntar a decisão de subir a taxa de juro devido à inflação vinda do lado da oferta (subida dos preços dos combustíveis e subida do IVA). Note-se que o mandato do BCE só fala da inflação. Em caso de conflito de objectivos, as recessões são secundárias para os monetaristas de Frankfurt.

Um leigo nestas matérias naturalmente fica perplexo. Os sacrifícios que se diz serem “inevitáveis e para nosso bem” não só não vão produzir os benefícios com que foram justificados – os “mercados” continuam assustados e já cobram taxas a caminho dos 7% - mas também vão transformar a presente estagnação em recessão e, consequentemente, negar o objectivo da política. Juntando a “ajuda” anunciada pelo BCE, a recessão converter-se-á em depressão e catástrofe social.

Tudo aponta para que Portugal acabe por recorrer ao FMI para ao menos pagar uma taxa de 5% na tentativa desesperada de travar o “efeito bola de neve” na dívida. Com a recessão na Grécia a tornar evidente que não vai poder cumprir o serviço da dívida, e com a Irlanda a enterrar-se na recessão e num défice superior a 30% para salvar os accionistas dos seus bancos, temos as condições perfeitas para uma agudização da crise do Euro.

Um cenário desta natureza inevitavelmente suscitará acesa discussão no seio do Conselho Europeu. Começam a criar-se as condições para mais um episódio de confronto entre a França (possivelmente apoiada pela periferia europeia) e a Alemanha (certamente apoiada pelos países onde domina a histeria do défice público). Mais tarde ou mais cedo chegará o dia em que a Alemanha vai dizer ‘basta’. Quando e como, ninguém sabe. Estamos a viver a História em tempos de incerteza radical.

Não podendo determinar o curso da História, ainda assim podemos influenciá-lo no sentido que mais nos convém. Uma greve geral, acompanhada de manifestações de rua, dá força a uma saída do atoleiro em que estamos metidos, uma saída que faça pagar a factura aos que produziram a crise e dela beneficiam e que permita lançar as bases de um modelo de desenvolvimento sustentável.

4 comentários:

  1. É mais fácil atirar as culpas para os estrangeiros em vez de assumir e criticar o governo incompetente, gastador e gerador de desigualdades que temos.

    Para enfrentar uma crise desta magnitude o que nos convinha era não estarmos dependentes de empréstimos estrangeiros para podermor ter comida e gasolina. Mas José Sócrates fez-nos o favor de endividar o país até não poder mais.

    No meio disto tudo, a saída do atoleiro é fazer uma greve geral para ver se a Sra. Merkel se incomoda com isso? Quantas greves gerais houve já na Grécia?

    Não seria melhor fazer uma greve geral para exigir a Sócrates que gaste o dinheiro onde ele faz falta (apoios aos que mais precisam) em vez de o gastar com boys e obras faraónicas a crédito?

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  2. Uma greve geral, acompanhada de manifestações de rua,
    impedirá a circulação e reduzirá o consumo de combustível

    dá força a uma saída do atoleiro em que estamos metidos, uma saída que faça pagar a factura aos que produziram....aqueles gajos que se fartaram de comer produtos importados a crédito?

    e viagens aos paraísos a crédito?

    os tais que vão fazer a greve geral devem incluir o governo na greve
    são todos parte do mesmo problema

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  3. Oh meus amigos...acho que se continua a ignorar o problema na sua genese o que é dramático,é verdade que os governos(e todo o parlamento com seus chupistas de esquerda e direita)teem alinhado nos erros que se conhece mas a questão central é a forma como está organizado o sistema financeiro que na prática obriga os estado a pedir emprestado ao dito mercado(o tal que Sampaio chamou de tenebroso)e é sse problema de base que tem de ser resolvido a bem das economias nacionais e do todo global!!
    E é aqui que a porca torçe o rabo...o unico que eu vejo em Portugal a falar(timidamente) disto é o Bloco de Louçã e os comunistas continuam sempre com a mesma cassete quando já nem o CD está actual!!
    Afinal que interesses servem os partidos??os de direita já sabemos,mas e os ditos de esquerda?????'?..........Hummmmmm
    Na prática as crises batem sempre à porta dos mesmos(povinho)e os interesses financeiros(mercado)sem rosto nos média corporativos aumentam seu poder centralizando o mesmo nas organizações globalitas anulando a soberania das nações!!
    Alguns chamam a tudo isto de conspiração,mas eu digo que é tudo demasiado evidente para lhe continuar a chamar apenas isso!

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  4. O nosso problema é que, como disse um pouco mais abaixo o Prof. Castro Caldas, alternativas de política jogam-se a um nível de governação (UE) que ultrapassa o "espaço (nacional) de debate e escolha democrática". Desta forma, somos constrangidos a seguir uma receita que levará ao aprofundamento da crise (no país) e que empurrará a própria UE para a recessão - note-se, sem corrigir os problemas de desequilíbrio interno que estão na base dos nossos problemas, talvez até contribuindo para os agravar. Mas sem alteração das regras do jogo, que alternativa existe?

    As greves serão compreensíveis mas face ao desfasamento entre os espaços de intervenção política e de governação económica, a sua eficácia é muito duvidosa - a menos que houvesse uma possibilidade de concertação dos representantes laborais a uma escala europeia - que não se vislumbra.

    Este contexto contém óbvio potencial para que, a prazo, se possa gerar uma situação explosiva nos planos social e político. Não vislumbro saída para esta crise sem que ela se aprofunde e atinja duramente a UE no seu conjunto, o que infelizmente vai acontecer. Só então, creio eu, haverá condições políticas para que o quadro da governação económica da UE seja repensado. Mas também abrirá espaço a coisas piores...

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