Por estes dias, já muitos portugueses perderam as ilusões quanto à mudança que acreditavam poder acontecer na Europa após as eleições alemãs. O embaixador da Alemanha em Lisboa não podia ser mais claro: “De todos os modos, teremos sempre no governo um leque de partidos pró-europeus e apoiantes dos programas de assistência, como o que está em curso em Portugal” (“Jornal de Negócios”, 16 Set. 2013).
À medida que nos aproximamos de mais uma ronda de negociações com a troika, torna-se evidente que o essencial da austeridade não é negociável. Salta à vista que, pelo menos no caso da Comissão Europeia e do BCE, a troika está determinada a impor uma reconfiguração do Estado social para que este deixe de ser o eixo de uma sociedade que aspira a níveis mais elevados de justiça social. O princípio neoliberal da “livre escolha”, na saúde e na educação, é agora abertamente defendido pelo governo e os países onde esta matriz ideológica alcançou o poder são apontados como os bons exemplos que deveríamos seguir.
De facto, a chamada “assistência financeira” ao país não visa colmatar um problema temporário de tesouraria. Tendo constatado os sintomas de um impasse no modelo de desenvolvimento do país, sobretudo desde que se integrou na UEM (défice externo persistente, acumulação da dívida externa, desindustrialização, desemprego elevado), o Memorando impôs-nos uma mudança inspirada nos princípios do Consenso de Washington e no ordoliberalismo alemão. Ao contrário das anteriores ajudas do FMI, esta intervenção da troika atropela a Constituição da República Portuguesa porque condiciona o financiamento à consagração de um modelo social e político de matriz neoliberal que, na sua institucionalização, viola princípios constitucionais basilares.
Ou seja, do ponto de vista do eixo Berlim-Frankfurt, Portugal ainda pode ser um caso de sucesso. Apenas precisa de colocar na Constituição o Tratado Orçamental para impedir políticas orçamentais contracíclicas, reconverter o Estado social num pobre Estado para pobres, destruir a classe média e os mecanismos de ascensão social que a mantêm, reduzir ainda mais 30% aos salários do sector privado (excluindo gestores e administradores), fazer da emigração uma válvula de escape das tensões sociais e, sobretudo, impregnar a sociedade portuguesa de uma sensação difusa, misto de culpabilidade e inevitabilidade. Quando tivermos chegado aí, a economia entrará numa estagnação duradoura, alternando pequenas recessões com períodos de crescimento sem criação de emprego. Portugal será então um país simpático e (ainda mais) barato para os reformados da Europa rica. Não terá dinheiro para manter as infra-estruturas públicas em todo o país, mas cuidará das zonas de acolhimento dos turistas, como se faz em Cuba.
Se continuarmos à espera dos resultados das eleições alemãs, ou das que virão a seguir para o Parlamento Europeu, é este o futuro que nos espera. Um futuro que trai miseravelmente o esforço de sangue, suor e lágrimas das gerações que nos precederam e tornaram Portugal uma comunidade, um Estado-nação com uma cultura de que nos orgulhamos e que enriqueceu a Europa e o mundo. Após décadas de ditadura, o país ainda anda à procura do seu modelo de desenvolvimento, talvez mesmo da sua identidade, possivelmente a de ser um elo de confiança entre a Europa e outros continentes, mas é um país profundamente solidário. Apesar de traído pelas suas elites, europeístas a qualquer preço, talvez Portugal ainda encontre energia para recusar tornar-se numa Detroit do extremo ocidental da Europa. Talvez sejamos capazes de recusar o estatuto de autarquia local europeia que nos preparam, um território empobrecido e sem instrumentos relevantes de política económica. Talvez sejamos capazes de construir uma alternativa política que nos devolva a esperança. Talvez.
(O meu artigo no jornal i)
O problema não está no Euro, mas em quem o controla. E quem o controla é o Monopólio Bancário Internacional.
ResponderEliminarSó isso explica que o BCE tenha escrito nos seus estatutos que só pode emprestar aos Bancos. Assim, empresta aos Bancos a taxas de quase 0% e estes, por sua vez, emprestam aos Estados, Empresas e Famílias aos juros que quiserem.
Maior roubo que este é impossível!
ResponderEliminarAbra esses olhos e caia na realidade, Jorge Bateira!
Saíamos do Euro e depois o QUÊ??
Guardávamos o "guito" da dívida para pagar as Importações em... novos Escudos (ou em Patacos), é isso?
Mas o dinheiro da dívida iria durar para quantos anos? E depois disso, acontecer-nos-ia o mesmo que às UCP's do Alentejo na Reforma Agrária, quando se esvaziaram as tulhas e os celeiros, é isso que propõe?
Diga-nos lá, como é que o senhor imagina Portugal dentro de dez anos sem o Euro? Uma Cuba (mas sem Varadero...)? Uma Coreia do Norte? Ou uma espécie de Hungria, mas sem centralidade, nem formação académica, apenas muito semelhante na percentagem de Ciganos?
Ou ainda tem sonhos épicos com o regresso da Siderurgia e da Lisnave, da Sorefame e da Mague, com paletes de operários analfabrutos, mas com muita consciência de classe?
QUE MILAGRE TRANSFORMARIA PORTUGAL, dentro de dez ou vinte anos sem Euro, numa Dinamarca, ou numa Áustria?
Saír do Euro só pode interessar às gerações idosas, que podem dar-se ao luxo de salvar-se do naufrágio construindo botes salva-vidas com a madeira da própria embarcação.
Mas essa estratégia não serve às novas gerações, cujo único destino seria uma EMIGRAÇÃO FORÇADA!
Saír do Euro pode dar jeito a quem tem muito a perder no Presente, mas não serve para nada a quem quer ganhar o Futuro!
Se a Esquerda continuar a queixar-se da Merkel e da Europa e do FMI e não perceber que o preblema está ADENTRO DE PORTAS, que a Tróica não impõe nada e que o nosso mal está NESTE GUVERNO, NESTE PREZIDENTO E EM QUEM FESTEJOU O ABSURDO DERRUBE DO ANTERIOR (tirando os que saltaram directamente para dentro do Pote), VAI CONTINUAR A PREGAR NO DESERTO DURANTE MUITOS E BONS!
Como dizia alguém, citado num livro de Francisco Louçã, "para se obterem boas respostas é necessário formular boas perguntas"!
Esta obsessão de certa Esquerda com a saída de Portugal do Euro não passa, nunca passará, de uma bravata quixotesca.
Escrevam isto nas vossas cabecinhas.
A pergunta que faço ao comentador anterior é se as novas gerações não estão já a ser forçadas a emigrar, no quadro actual com o tipo de políticas que estão a pretender sustentar a moeda única. Não me parece que isso seja argumento para defender a preservação de Portugal na zona euro. Devo acrescentar, contudo, que não tenho posição definitiva a respeito da manutenção do euro em Portugal, visto já ter ouvido bons argumentos de ambos os lados do debate que está a ser travado a esse respeito.
ResponderEliminarPara o Jorge Bateira tenho uma outra questão. Considerando que ele e os seus colegas deste blogue têm prestado um contributo fundamental para o diagnóstico da catástrofe que nos está a ser imposta e para as políticas económico-financeiras que poderiam constituir uma alternativa, há, porém, uma interrogação que me assalta: não basta dizer, como os "Ladrões de Bicicletas" têm sustentado, que é necessária uma alternativa política que viabilize essas soluções. É preciso dizer como se chega a essa alternativa, como pode ser ela construída e com quem. Se ela tem de passar, como tudo indica, pelos partidos de esquerda com assento parlamentar, e vendo nós que não há entendimento possível entre eles e que o PS permanece disposto a subscrever o essencial do austeritarismo, a minha pergunta é: onde estão as condições para a construção dessa alternativa?
Júlio de Matos,
ResponderEliminarsair do euro é uma catástrofe mas com fim à vista porque possibilita a desvalorização da moeda, uma renegociação da dívida liderada por nós e não pelos credores e a canalização de fundos para relançar a economia. ficar no euro é uma catástrofe sem fim à vista que não nos permite fazer uma renogicação como deve ser, que não nos permite mudar de políticas, que não nos permite desvalorizar a moeda.
o problema dentro de portas é uma economia que sempre foi frágil à custa de décadas de políticas do centrão - o problema fora de portas foi uma crise financeira brutal, seguida de um ataque especulativo à nossa dívida e das medidas deficientes que a europa de merkel e durão barroso ditaram.
o nosso inferno ainda vai a meio - se tiver amigos na grécia, aconselho-o a pedir notícias, para ficar a saber o que nos espera, se ficarmos no euro.
eu sou europeísta - o que não sou é suicida.
Ab,
Filipa
A resposta que dou ao Mário M. é sim, as novas gerações estão já a ser (trágicamente) forçadas a emigrar no quadro actual, em resultado das políticas que estão a pretender sustentar a moeda (dita) única. Todos o sabemos.
ResponderEliminarNão me parece é que isso seja argumento suficiente para defender a saída de Portugal na zona Euro! Que quanto a mim poderia ter como consequências um aprofundar, a prazo, dessa tendência suicida, mesmo que, no imediato, pudesse até aparentemente invertê-la (prever as consequências sociais relevantes uma saída de Portugal do Euro é quase como prever o comportamento e a trajectória de um comboio de Alta Velocidade quando sai dos carris...).
Devo acrescentar, contudo, que também eu não tenho posição definitiva a respeito da manutenção de Portugal no Euro, visto já ter ouvido bons e maus argumentos de ambos os lados do debate que está a ser travado a este respeito.
Ah e, já agora, subscrevo integralmente a pergunta que o Mário faz ao Jorge Bateira (já somos dois...).
Cara Filipa,
ResponderEliminarquando diz "uma catástrofe mas com fim à vista, porque possibilita a desvalorização da moeda, uma renegociação da dívida liderada por nós e não pelos credores e a canalização de fundos para relançar a economia" está a pressupor uma quantidade enorme de condições que me parecem, no mínimo, de probabilidade muito duvidosa, ou seja, está a laborar no erro das boas intenções (e das suas convicções).
Basta pensar no "liderada por nós" - é a Filipa ou sou eu que vamos negociar com os credores? Ou será um "guverno" chefiado por Marco Ant.º Costa e com Durão Barroso em Belém (olhe que este pesadelo é tão provável quanto o oposto, ou mais ainda!).
E o mesmo se pode dizer quanto à "canalização de fundos para relançar a Economia" - mas qual Economia? A do betão e da expansão dos subúrbios, emblemática do Cavaquistão? A da multiplicação de redes viárias e de eventos, continuada pelo Guterrismo? Ou uma Nova Economia, mais parecida com a deseconomia dos "Países emergentes" tipo-Brasil, Rússia, ou mesmo Angola, feita de negociatas e corrupção. É isso que espera quando fala em relançar a Economia? Tenho a certeza de que não, mas nada nos garante que não seja o que iria acontecer.
Daí até a sua saída do Euro se transformar numa catástrofe SEM fim à vista e maior ainda do que a atual - que não me parece seja uma fatalidade, mesmo permanecendo no Euro! -, seria coisa de poucos anos.
Concordo que o problema dentro de portas é uma Economia que sempre foi frágil, mas discordo do seu chavão estafado "à custa de décadas de políticas do centrão" - aqui já entramos nos domínos estritos da Fé (e não lá muito "católica")...
Pense nisto: o problema fora de portas - uma crise financeira brutal, seguida de um ataque especulativo à nossa dívida e das medidas deficientes que a Europa de Merkel e Durão Barroso ditaram - está a ter consequências apesar de tudo diferentes na Itália e até mesmo na Espanha, do que teve em Portugal. São os outros problemas adentro de portas, aqueles que transcendem a SECULAR fragilidade da nossa Economia (deixe lá o "centrão" e o PREC em paz...) que fazem com que os problemas fora de portas tenham consequências tão dramáticas.
Digo-lhe com todas as letras, para que não fiquem dúvidas: é este "guverno", são estas políticas, FOI O IR ALÉM DA TRÓICA que desgraçou Portugal! E é a ausência de alternativas CREDÍVEIS a esta situação que continua a lixar Portugal, não é a Merkel e o Schäuble (apesar de toda a importância que têm, note-se).
Sei bem que o nosso inferno ainda vai a meio - tenho bons amigos na Grécia, mas nem preciso de lhes pedir pedir notícias para ficar a saber o que nos espera, se ficarmos no Euro COM ESTAS POLÍTICAS E COM ESTES GOVERNANTES.
Mas sei também identificar muito bem o que provocou e quando se traçou o destino do nosso Inferno. E a Esquerda, os intelectuais e os académicos, tanto ou mais do que os ólíticos, têm pesadas responsabilidades nesse dia dia fatal que foi o 23 de Março de 2011, em que recusaram o PEC4 ao lado da Direita!
Eu também sou europeísta e de Esquerda - o que não sou é cego, nem surdo, nem suicida.
Com as melhores saudações democráticas.
As minhas desculpas pelas gralhas várias no meu anterior comentário.
ResponderEliminarEscrevendo para pessoas inteligentes e decerto ocupadas, só vou maçar-vos a corrigir o mais gritante:
"Mas sei também identificar muito bem o que provocou e quando se traçou o destino do nosso Inferno. E a Esquerda - os intelectuais e os académicos, tanto ou mais do que os políticos - tem pesadas responsabilidades nesse dia (...)".
Júlio de Matos,
ResponderEliminarliderado por nós significa liderado pelo país devedor e não pelos credores. obviamente, uma renegociação liderada por durão barroso não é aquilo que tenho mente, e julgo que isso se percebe. a única condição para uma renegociação da nossa dívida como deve ser é ter um governo de esquerda - e aí, como disse o Mário Machaqueiro, o problema é que não o temos e não se prevê que vehnamos a ter, pelo menos a acreditar nas sondagens.
há exemplos de recuperação económica depois de auditorias à dívida e de renegociações. não há exemplos de recuperação económica em países intervencionados pelo FMI, o que há sempre, é a intensificação da desigualdade social.
não me parece que a solução esteja a funcionar em Espanha onde, à semelhança da Grécia os desempregados deixaram de ter direito a ir a hospitais públicos; onde as mães se suicidam porque têm uma dívida de 900 euros de prestação da casa mas mesmo assim são obrigadas a entregar a casa ao banco, onde o investimento na educação e na ciência é menor (proporcionalmente) do que cá, onde a taxa de desemprego está acima dos 25 e 27%. se isto é um sucesso, não é o sucesso que eu quero para portugal.
obviamente também que sair do euro para regressar à falsa economia do betão não nos serve para nada. quanto à economia da negociata e da corrupção, infelizmente, é a que temos neste momento, precisamente em ligações duvidosas com Angola, para não falar de nacionalizações de fraudes como o BPN, de negociações de PPPs usurárias, de swaps, de submarinos - tudo pela mão do centrão - não é um chavão, isto do centrão, é a realidade da história do nosso país.
o público online anuncia hoje vitorioso que a Irlanda saiu oficialmente da recessão: saiu oficialmente da recessão mas o PIB continua abaixo do que era há 1 ano e o regresso aos mercados está dependente da negociação de um programa cautelar com a europa, que é como quem diz (o Público, claro, não diz) de mais um resgate. o governo irlandês já veio dizer que em 2014 não abrandará a austeridade - e isto apesar da "saída da recessão" vir pela mão do aumento das exportações E do consumo privado.
não há a mínima intenção na europa de merkel-barroso de ter uma europa a uma velocidade só: há intenção de ter duas europas e portugal, espanha, itália, irlanda, grécia, chipre - e, em breve, os países da europa de leste - são os países destinados à europa "de baixo".
acreditei por momentos que a eleição de Hollande fizesse alguma diferença, não fez nenhuma.
quer ideias? eu sou bióloga, não sou economista, mas ideias não me faltam: taxa sobre a riqueza acumulada, eliminação das pensões do estado acima dos 4mil euros/mês, proibição de acumulação de pensões do estado com pensões do privado quando as duas somadas dão mais de 4000euros/mês, renegociação das PPPs, proibição dos offshore que representam saídas de 30mil milhões por anos, requalificação comparticipada de prédios de habitação, relançamento da produção agrícola, diversificando-a e com produção de produtos orgânicos para exportação para o norte da europa e consumo interno, introdução de uma taxa sobre o carbono nos bens de consumo (proteccionismo, é isso mesmo), introdução de uma taxa tobin, elaboração de protocolos comerciais com os emergentes, fiscalização efectiva dos monopólios e dos cartéis, período de nojo de 10 anos para nomeações para o governo de quem vem de empresas privadas e da banca, fim do sigilo bancário, renegociação de protocolos com outros países no sector pesqueiro.
a maioria destas propostas não são possíveis dentro da união europeia, e muito menos no euro. o que é possível dentro da união europeia e do euro é ter uma economia em recessão com 17% da população ativa no desemprego, onde a as fortunas dos mais ricos crescem 10%.
temos em portugal a geração mais qualificada de sempre - está desempregada ou emigrou. a isto chama-se deitar dinheiro à rua. não há solução possível para a nossa economia neste espartilho.
Ab,
F.
Se acharem que isto acrescenta alguma coisa ao debate público façam o favor de partilhar. Estou cansado de discussões destas onde não há nada de realmente novo. Por melhores que sejam os argumentos, estes debates são como discutir se o que o pai deixa ter é suficiente ou em vez de se trabalhar a sério em algo de novo.
ResponderEliminarNão há aqui futuro nenhum. Por favor discutam isto ou coisas da mesma família.
http://eurosom.blogspot.co.uk/2012/11/novo-modelo-monetario-revisto.html
PERDI A OUTRA: A QUESTÃO QUE COLOCO SEMPRE É SABER SE É COMPATÍVEL SER-SE CONTRA, E BEM, O CORTE NOS SALÁRIOS E PENSÕES E A FAVOR DA SAÍDA DO EURO QUE PROVOCARÁ, PELA INERENTE SENÃO DESEJADA DESVALORIZAÇÃO UMA QUEBRA DO PODER DE COMPRA DAQUELES AÍ DE....30%? SERÁ? OU ESTAREI A SER OTIMISTA? E ALGUÉM SE ATREVE A QUANTIFICAR AS CONSEQUENCIAS EM TERMOS DE ABASTECIMENTO E PREÇOS DA SAÍDA NOS SEGUINTES CONJUNTOS BENS: PRODUTOS ALIMENTARES,COMBUSTÍVEIS E MEDICAMENTOS. CUMPRIMENTOS CARLOS PESSOA
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