segunda-feira, 30 de julho de 2012

Leituras

Ler economistas políticos críticos do “Sul” que escrevem sobre a crise da zona euro é compensador, já que há muito tempo que pensam sobre os problemas da inserção (in)dependente e sobre os malefícios da liberalização financeira numa perspectiva comparada. Carlos Bresser-Pereira e Jayati Gosh são dois bons exemplos.

Bresser-Pereira escreve na Folha de S. Paulo: “Diante desse quadro, digo a meus amigos espanhóis que a austeridade não resolverá seus problemas (muitos deles concordam) e que melhor para todos os países europeus era decidirem em comum acordo pela descontinuidade do euro, para, assim, evitar uma crise maior e garantir a União Europeia. Diante dessa observação, eles se calam. A sobrevivência do euro é tabu para eles.” Vai deixando de ser tabu em alguns círculos. Segue-se a invocação da experiência da Argentina, ali tão perto.

Sendo um dos principais economistas brasileiros “neo-desenvolvimentistas”, Bresser-Pereira tem enfatizado nos seus trabalhos académicos a importância de uma política cambial e de controlo de capitais especulativos amiga da indústria, o que significa que só pode olhar com cepticismo para um euro que consolidou tudo aquilo que, segundo ele, os países que se querem desenvolver não devem fazer e que bloqueou todos os instrumentos de política a que devem deitar mão.

De forma convergente, embora seja mais politicamente mais radical, Jayati Gosh da Índia oferece no The Guardian uma formulação tão esclarecedora quanto de leitura aconselhável para os moralistas imorais das finanças que aqui temos criticado: “com fluxos de capitais livres e acesso sem barreiras a crédito externo por parte dos agentes nacionais, não pode existir política macroeconómica prudente; os equilíbrios ou desequilíbrios internos mudarão de acordo com o comportamento dos fluxos de capitais, que por sua vez respondem às dinâmicas económicas que eles próprios iniciaram”. O padrão foi tão claro quanto repetitivo na época de todas as liberalizações financeiras. A Espanha parece tirada de um manual de crises financeiras. Portugal parece um pouco mais complicado, como eu e José Reis argumentamos, até porque os problemas começaram mais cedo e algumas ilusões sobre desenvolvimento sem instrumentos de política adequados mais cedo e lentamente no fundo acabaram. De resto, também vai ficando claro que o ajustamento imposto só vai causar “dor”, como indica até a The Economist em mais uma das suas magnificas capas.


Como sair daqui? Que tal aprender com quem já esteve aqui e daqui conseguiu sair, como aconselha Gosh? Gosh apela a que atentemos em países tão diferentes como a Malásia ou a Argentina, ou a Islândia, já agora: do controlo de capitais à reestruturação da dívida, só a rebelião em relação à sabedoria económica convencional resulta. Fica a pergunta que a esquerda tem de debater e enfrentar abertamente em cada um dos países: “será que tudo isto pode ocorrer no colete-de-forças imposto pela união monetária?”

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