Não é, ao contrário do que Mota Soares pretende despudoradamente fazer crer, pela necessidade de conter «fraudes e abusos». Como bem lembra o José Vítor Malheiros, o RSI é apenas a prestação social mais fiscalizada, estimando-se (de acordo com os cálculos do Nuno Oliveira para 2009/10) que seja de apenas 3% do total o peso das situações de fraude e abuso (valor que terá, aliás, registado descidas consecutivas após o levantamento do sigilo bancário para os beneficiários desta linha de combate à pobreza).
É muito provável, isso sim, que a explicação para tão cruel aperto, vinda de um governo farisaico que prega a «ética social na austeridade», se encontre no aumento do número de beneficiários que tem vindo a registar-se nos últimos meses, apesar das crescentes restrições e da poupança que se obtém à custa do empobrecimento dos mais excluídos. Isto é, mesmo com o estrangulamento sucessivo das condições de acesso ao RSI, o desemprego galopante e a deterioração das condições de vida de muitas famílias tornam-nas elegíveis para receber as magras prestações desta medida.
O que conta é, portanto, cortar. Cortar para manter o curso da linha descendente (que se tenta encobrir de forma infantil), até se conseguir acabar de vez com este miserável «subsídio à preguiça». Para tal, nada como procurar denegrir ainda mais os beneficiários do RSI, recorrendo a supostas medidas de contenção de fraude que, nas entrelinhas, não mais pretendem (de modo particularmente execrável), do que passar a ideia de se estar perante gente com imperdoáveis sinais exteriores de riqueza (possuidores de um carro ou de uma conta no banco com 25 mil euros).
Mas, mais grave ainda, estipular o corte da prestação em casos de prisão preventiva (determinando assim a condenação antes de decisão judicial) ou dificultar o acesso dos imigrantes ao RSI, exigindo no mínimo um ano de permanência legal no país a residentes estrangeiros oriundos da União Europeia, que passa para três anos no caso de cidadãos que provêm de outras partes do mundo.(*)
Como assinala Carlos Farinha Rodrigues em artigo recente, os cortes sucessivos no RSI estão a reduzir drasticamente a eficácia do combate à pobreza no nosso país, sejam quais forem os indicadores usados para o efeito (clicar no gráfico para ampliar). Como se não bastasse, portanto, a circunstância de Portugal se encontrar em lugar cimeiro entre as nações ocidentais com maiores desigualdades na distribuição de rendimentos.
Narra a bíblia que, depois de Caim ter morto Abel, Deus lhe terá perguntado: «onde está o teu irmão?». Ao que ele respondeu, em jeito cobarde e altivo, «não sei, sou eu guardador do meu irmão?».
(*) Recorde-se que Portugal manteve, em 2011, o segundo lugar conquistado em 2008 no MIPEX, o mais completo estudo comparativo de práticas de integração de imigrantes, realizado em 28 países, 25 dos quais Estados-membros da União Europeia.
São todos uma cambada...
ResponderEliminarApenas falam de cortes e mais cortes.
Pergunto:
-Quando virá o dia de eles começarem a cortar nas muitas mordomias que recebem gratuitamente...?
Mais uma entrevista encomendada. Esta, a Miguel Beleza, que acha “que não é drama um segundo resgate”. Para continuar a ser pago com língua de palmo.
ResponderEliminarOs meios de comunicação, estando nas mãos da mesma seita que governa, continuam a manipular despudoradamente a opinião pública, preparando-a para o cadafalso. Repare-se que são sempre “os outros” - os porta-vozes do governo - que aparecem com as “novidades”.
Nunca vai haver dinheiro que baste para satisfazer o apetite dos agiotas e especuladores. Isto, à custa da perda de direitos que afinal só conferem mínimos – sim, umas migalhas - aos mais vulneráveis. A par disto, vamos assistindo a um encarecimento brutal do custo de vida (saúde, energia, transportes, etc.), à medida que o Estado vai sendo enxotado dos “negócios”. Tudo se vende, até a soberania…Putedo (desculpem-me)!
A verdade É um pouco diferente dessa....
ResponderEliminarhttp://www.brunojacinto.com/a21/2012/04/02/rendimento-minimo-criminalizar-a-pobreza-ou-obrigar-a-retribuir-o-que-e-dado/
As alterações propostas por este governo ao regime de prestações sociais, estigmatiza, rotula os cidadãos, favorece o assistencialismo e a caridade que salva consciências, mas agrava a dependência. Aos poucos, regressamos ao passado e desenterramos fantasmas e representações que, infelizmente, ainda permanecem no inconsciente português.
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