quinta-feira, 29 de abril de 2010
O ataque às vítimas da crise, ou o triunfo da imoralidade
Lê-se em toda a imprensa escrita e ouve-se na rádio e na televisão que Portugal está a ser atacado pelos especuladores financeiros, essas entidades que, na óptica de alguns analistas "sérios", fazem as suas escolhas racionais por inspiração divina e que actuam nos mercados à margem de quaisquer considerações políticas ou éticas. As apostas dos especuladores em torno da possibilidade de incumprimento por parte do Estado português traduzem-se na subida das taxas de juro da dívida pública, apoiado pelas sábias sentenças das todo-poderosas agências de rating, aumentando a instabiliade e gerando um clima de pessimismo generalizado.
Enquanto a Alemanha vai fazendo tardar a decisão de apoiar a Grécia, permitindo assim o estímulo do apetite dos abutres, o governo português e o maior partido da oposição fizeram convergir as suas posições, em nome do “interesse nacional”. Como resposta aos ataques dos especuladores, o governo decidiu, por sua vez, atacar aqueles que mais têm sofrido com a crise, cortando no apoio aos desempregados - e há até, quem lhe chame "moralização", como se "incentivar o regresso dos desempregados ao mercado de trabalho" não tivesse como pressuposto que o desempregado é um preguiçoso, um privilegiado, um "susidiodependente" cuja humilhação e rebaixamento necessita ser revista e aumentada, responsabilizando-o pela sua situação, retirando-lhe parte do seu dinheiro, forçando-o a fazer "trabalho a favor da comunidade", como se tivesse que expiar um crime; como se tudo dependesse de uma decisão pessoal da vítima e não da estrutura de oportunidades da oferta.
Qual Abraão, cego de obediência e desejoso de agradar ao poder divino dos mercados, o governo está prestes a imolar as principais vítimas da crise e, com elas, a sua última réstia de dignidade, se é que ainda lhe sobra alguma. O ataque aos desempregados a mando dos mercados financeiros tem um nome: cobardia política. Não sabemos se esta nódoa sairá com benzina eleitoral, mas palpita-me que Pinto Balsemão levará Passos Coelho – o próximo primeiro-ministro de Portugal - à próxima reunião do Clube de Bilderberg, tal como antes fez com Durão Barroso, José Sócrates e Santana Lopes. E não deixa de ser curioso pensar que há quem acalente a ilusão de que em 2011 a oposição à continuidade da selvajaria neoliberal se poderá vir a fazer a partir da Presidência da República… Mas nenhum anjo poderá já deter a violência do golpe.
Passos Coelho é aquilo que se pode chamar um homem de sorte, virou "estadista" fruto das circunstâncias! A sua antecessora no cargo encarregou-se de colocar o PSD em níveis pré-comatosos o que lhe facilitou a vida, em particular, no que diz respeito à expectativas quanto à sua prestação. Por outro lado, o ataque à nossa economia e a necessidade do Governo mostrar aos "mercados" que estaria disposto a tudo, inclusive à criação de um Bloco Central factual se a isso obrigasse, veio colocar o estreante Passos Coelho no centro do palco político. Oxalá não se deslumbre com a adrenalina dos holofotes que por vezes podem desnortear os mais incautos.
ResponderEliminarA ver vamos!
Como é óbvio existe uma a promiscuidade entre os bancos e as agências de "rating". Essas a que os nossos governantes dão ouvidos, em particular o nosso Ministro dos Bancos, que parece acreditar piamente nelas, o “santinho”.
ResponderEliminarAo darem ouvidos a tais agências os nossos governantes mais não estão a fazer do que jogar o jogo das mesmas e a promover a ideologia do “Menos Estado, mais privado”.
As notações das agências de "rating" são uma falácia e não têm nada de inocente: são um pretexto para os servidores da causa neoliberal tomarem decisões que acentuam as desigualdades sociais, o desemprego e a pobreza. Decisões que transferem a riqueza e recursos do Público para o Privado, ou seja, para os mesmos de sempre. Decisões que destroem o Estado social, como se vê pela redução anunciada dos subsídios de desemprego.
Não nos deixemos enganar pelos neoliberais que nos governam.
Um testemunho pessoal:
ResponderEliminarDe cada vez que ia ao centro de emprego fazer a apresentação periódica de 15 em 15 dias, pensava em mim como um criminoso sujeito a apresentações periódicas às autoridades para não cair no crime.
Entrava com vergonha, com os olhos postos no chão, mas ainda assim reparava que a maioria dos que ali estavam faziam o mesmo e estavam ali pelo mesmo motivo que eu.
É o que sentimos ao princípio, esse desamparo do rótulo "desempregado"... Podemos ser 600000, mas cada um de nós se sente sozinho no mundo.
Depois sentimos culpa, é por nossa culpa que estamos assim, ou porque não somos produtivos, ou inteligentes... depois sentimos raiva porque todos conhecemos alguém com emprego com muito menos mérito do que nós... depois queremos denunciar as cunhas e os amigos que remetem alguns para um caminho fácil e aos outros para o fundo de(o) desempregro.
Por último se somos jovens como eu, sentimos vergonha dos nossos pais... queremos dar-lhes a alegria que sempre ambicionaram de verem o filho com a vida encaminhada agora que a sua se aproxima do fim. Se formos velhos, imagino eu, sentiremos a mesma vergonha olhando para os nossos filhos porque falhamos a nossa obrigação em dar-lhes um futuro melhor.
Não me importo que me tirem dinheiro. É questão de apertar mais o cinto.
O que não suporto é que me tirem a dignidade a cada conferência de imprensa.
Se não têm solução ofereçam-me empatia, ou permitam que partilhemos o nosso destino com quem está igual a nós. Se não têm solução, não repitam que a culpa é nossa, não façam de nós escravos, não façam de nós ilhas...
Quando chegamos a este ponto, nós já nem queremos trabalho, ou vencimento, queremos uma oportunidade para mostrar o que valemos, queremos ser úteis, ter orgulho, chegar ao fim do dia e saber que o pão que comemos é pago com o nosso suor.
Não é um subsídio que nos levanta a cabeça, são as vossas palavras que não nos deixam levantar do chão.
um desempregado
Foram 36 anos a comer bife do lombo.
ResponderEliminarEntão não se rapam os ossos?
Talvez tenhamos de todos ser mais realistas, dado que os comentários à reacção do governo aos mafaldados ratings, é demasiado previsivel, vindo de quem de antemão se sabe possa vir!
ResponderEliminarDireita de uma mesma forma, esquerda de outra meesma forma.
É mesmo muito pouco.
Agencias de rating são o que são, mas desgraçadamente influenciam....pena, mas...como não acontecer????
Subsidios de desemprego, doença ou inserção são: o que próprio nome o define!
E quando se ouve dizer que é justo recusar um emprego de 475,00 euros se se está a receber um subsidio de desemprego de 425,00 e vai-se gastar 50,00 em transportes! logo fica-se a receber o mesmo trabalhando ou mandriando...., algo não vai bem...aonde e em quem????????
AMCD, concordo em absoluto contigo.
ResponderEliminarNão podemos perder de vista onde a crise começou.
Onde é que ela começou?
O propósito europeu de equilíbrio entre estado social e liberalização económica caiu há muito! Infelizmente continua a dar-se primazia em larga escala ao segundo factor em detrimento do primeiro! E as consequências!? Já as conhecemos! E aprender? Algum dia iremos aprender?
ResponderEliminarÓ anónimo, tem lá calma! Isto do desemprego andam todos (os políticos e os “investidores”) a empurrar o assunto com a barriga. Sem coragem para dizer que, mesmo quando houver recuperação económica vai continuar a haver muito desemprego, porque a causa principal do desemprego é o aumento exponencial da automatização. Cada vez vai haver menos empregos decentes, daqueles em que se ganha mais que o salário mínimo porque é desempenhado por uma pessoa “qualificada”, pois já houve alguém que programou uma máquina para desempenhar essa qualificação.
ResponderEliminarPortanto, anónimo, não tens que ter complexos de inferioridade, estás desempregado, como eu estou, porque a “Sociedade da Inovação e da Informação” a isso nos conduziu.
As agencias de Rating bla bla bla...
ResponderEliminarVocês sabem quem paga as agências de rating para que estas emitam os seus ratings?
São as entidades emissoras de divida! Quem paga os ratings da divida Portuguesa é o estado Português!
Para mais as agencias de rating nunca se enganaram por serem demasiado pessimistas. O conflicto de interesses funciona precisamente ao contrario. As agencias dão boas notas para ajudar a vender a divida dos seus clientes. E as entidades emissoras têm sempre a opcção de mandar a agência não revelar a sua nota.
Os governantes Portugueses deviam era elogiar as agências que durante decadas os ajudaram a saquear os credores vendendo obrigações que jamais poderão pagar.