sábado, 10 de dezembro de 2016

Quem manda mesmo aqui?


Em Novembro de 2013, queixava-me do seguinte: durante meses a fio tivemos de suportar os euro-iludidos com a narrativa das eleições alemãs; aguentem, depois é que pode começar a mudança na Europa, diziam.

Agora, em final de 2016, falta menos de um ano para as novas eleições legislativas alemãs e já recomeçou o discurso aparentemente euro-iludido: aguardemos por 2017, diz-se, então as coisas podem começar a mudar depois das eleições alemãs; por exemplo, no que à renegociação da dívida diz respeito.

Nada mudará para melhor pela Alemanha, claro, dado o consenso ordoliberal entranhado numa potência credora: a renegociação da dívida é sempre para ir sendo feita nos tempos e nos termos dos credores, para ir sendo usada como instrumento de condicionalidade política, garantindo a neoliberalização das economias políticas nacionais periféricas, sobretudo no campo onde quase tudo se decide, o das relações laborais, ou seja, garantindo custos salariais, directos e indirectos, relativamente baixos para os capitais que circulam por aí a partir do centro.

A Grécia, em greve geral esta semana contra este regime externo e os seus executantes internos, aí está a ilustrar pela enésima vez a economia política europeia da dívida. O eco de Bruxelas cá no burgo, também conhecido pelo nome de Conselho de Finanças Públicas, também confirma à sua ideológica maneira isto.

E como isto está tudo ligado, não causará admiração que um governo que não quer tomar qualquer iniciativa na área da dívida, com receio das implicações de tal acto de desobediência em termos da pertença a uma zona monetária disfuncional, seja também um governo que, pelos vistos, não quer mexer nas regras laborais regressivas herdadas da troika e do seu espírito nos anos anteriores à agressão externa, em particular na área onde as vitórias de classe foram mais fortes: a destruição da contratação colectiva.  Se isto se confirmar, a política de um governo apoiado pelas esquerdas será apenas um momento temporário de travagem do tal comboio rumo ao abismo.

Na melhor das hipóteses, tal dever-se-á ao facto de não se querer afrontar o eixo Bruxelas-Frankfurt numa área que este segue com particular atenção. Não preciso de dizer mais nada sobre a natureza da integração europeia e das suas instituições de suporte. Já só não vê, quem não quer mesmo ver. Sejamos francos: o aprofundamento da crise de legitimação destas instituições controladas pela grande potência da zona, fruto do agudizar das contradicções que lhe são inerentes, é uma condição necessária, se bem que obviamente não suficiente, para mudar as regras viciadas deste jogo e para dar mais margem de manobra aos governos democráticos nacionais das periferias.

12 comentários:

  1. Excelente post. É isso mesmo!
    Manda quem pode, obedece quem deve.

    Andaram anos a fio a viver da dívida, ainda hoje vivem, e ainda planeiam viver da dívida por muitos anos.
    E querem começar a reestruturar para poderem gastar mais um tanto em melhores serviços gratuitos, mais mézinhas e mais ajudinhas?
    Só se a Merkel fosse um asno completo é que ia numa dessas ou sequer admitisse que se falasse disso antes das eleições.

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  2. Eu gostava de perceber o que quer exatamente dizer com o 'aprofundar da crise de legitimação' da UE. Seja ainda mais franco a esse respeito, por favor. Será a vitória de Wilders na Holanda, de Le Pen em França ou da AfD na Alemanha parte desse 'aprofundar da crise'? Eu espero que não. Pelo menos no que diz respeito à eleição de Trump, o PCP soube distinguir quem era o adversário principal e adivinhe, no próximo ano, esse adversário não será certamente Merkel. Quanto a nós por cá, e em face daquilo que diz, gostava mesmo de perceber qual a alternativa à Geringonça? O regresso da Direita ao poder? Olhe para o que disse Jerónimo de Sousa, 'o quanto pior' quer mesmo dizer 'quanto pior, pior'... Eu, se fosse a si, ficaria era contente com os resultados alcançados, e meteria 'as perspetivas revolucionárias' na gaveta. Quando há revoluções há convulsões e costumam morrer pessoas... A mim, preocupam-me muito mais todos os Germanos, que essa coisa abstrata do 'género humano'...

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  3. Um excelente post - mais um - de João Rodrigues

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  4. Que faz mexer por aí um ou outro comentador inquieto.

    A começar pelo sujeito das 19 e 55. Um autêntico mimo a que não é alheio algum histerismo fora de horas.

    Vejamos: "Um excelente post" diz o sujeito. Mas a seguir debita um "Manda quem pode, obedece quem deve", revelando que isto da compreensão é coisa pantanosa.

    Será que o sujeito em causa,um tal Jose, leu o mesmo post que nós? É que o tal "manda quem pode , obedece quem deve" é o oposto do que diz João Rodrigues.
    É mais o grito de guerra dos idos do obscurantismo, os tais que gritavam do alto dis seus tamancos:
    "Quem manda, quem manda, quem manda" perguntavam os esbirros....Salazar, salazar, Salazar repetia a horda de mão estendida na saudação típica.

    Serão reminescências, saudades, in vino veritas?

    Mas aí está presente o velho hálito da serpente a sair do ovo

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  5. Quanto a Jaime Santos.

    Começa por abraçar um hino pateta. Gostava de saber, diz ele, naquele tom deslocado de mestre-escola malcriado, o significado do 'aprofundar da crise de legitimação' da UE.

    Far-se-á de farsante ou o quê? Confirmará o velho ditado de que o pior cego é o que não quer ver.
    Passa entre os pingos de chuva, escondendo que as populações têm sistematicamente dito NÃO às posições do directório pos-democrático que defende.
    Escutem-no. Ouvem o seu silêncio atroador sobre o Brexit? Sobre o refrerendo em Itália? Sobre a "França é a França" do canalha do Hollande? Sobre a exigência de pedido de explicações a Junker pelos negócios em que se envolveu?

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  6. Depois e sempre, uma obcessiva necessidade de colar aos outros, o que dizem outros. Como se esta história de se pensar pela própria cabeça não fosse prerrogativa de cada um. Como para mostrar ou seguidismo puro ou antagonismo impuro. Usa e abusa de Jerónimo de Sousa como exemplo e ainda por cima de forma deslocada e desfocada.
    Usa assim muletas nestes debates, em que sistematicamente não apresenta quaisquer resultados desta união europeia pos-democrática, preferindo desviar o debate para outros, ou para Jerónimo ou para Cuba ou para Angola, ou para o que quer que seja que não torne patenta a ausência de discurso sobre as virtualidades da trampa em que vivemos.

    Claro que essa coisa abstracta do género humano não preocupa alguém como Jaime Santos. Gsota deste status quo. Gosta que se viva com um cutelo sobre a cabeça. Gosta dos jogos de salão de Schauble e gosta até de ufano elogiar os tecnocratas com que quer limpar todo o perfume de pé-descalço nas decisões a tomar. Gosta de chantagens e de chantagistas. Gosta de dependência e de submissão

    As revoluções assustam-no. Por poderem morrer pessoas? Mas todos os dias morrem pessoas vítimas das políticas engendradas pelos políticos que defende ou com os quais compactua. E os que morrem vítimas das decisões tão democráticas da corja que comanda o mundo objectivadas na invasão, destruição, aniquilação de outros países, como a Líbia ou a Síria?

    E não vê, desta vez não vê e está calado, sobre o perigo verdadeiro que aí se aproxima pela mão da extrema-direita que acarinha involuntariamente nestes processos de negação da realidade. A extrema-direita avança servindo-se da traição desta social-democracia de pacotilha. Depois as mortes serão contabilizadas como?

    Venham assim as Revoluções necessárias porque a humanidade está à beira do precipícioe merece mais, muito mais e a luta por um mundo mais justo é um velho sonho da humanidade (que não os germanos que JS gosta tanto).

    Quem haveria de dizer que a Revolução de 25 de Abril fosse assim colocada em causa por alguém como Jaime Santos?

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  7. A reestruturação da dívida parece inevitável até porque as taxas de juro já vão em praticamente 4%.

    Mas não vos iludis, pois os agiotas sabem negociar. Reestruturar, não havendo corte (haircut), como apenas houve na Grécia mas quando a mesma ia nos 180% do PIB, apenas significa protelar o pagamento e aumentar os prazos de maturidade, o que muitas vezes significa pagar mais no cômputo geral.

    Para mim o que deveria ser feito é simplesmente o "calote", porque os agiotas já ganharam muito connosco. Em qualquer caso insisto que não podemos continuar a ter défice público, pois défice implica gastar mais do que se recebe, e esse diferencial é comportado com recurso a dívida.

    Assim a esquerda incorre num sofisma crasso ou na quadratura do círculo: não ter qualquer preocupação séria em baixar o défice público e querer reestruturar a dívida, quando a segunda é consequência direta do primeiro.

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  8. O Sr. Jaime Santos diz-nos, sabiamente, que quando há "revoluções" morrem pessoas. Certamente. Contudo há que reconhecer que as "situações" - o servilismo medieval, a Santa Inquisição, a escravatura clássica e moderna, a exploração brutal do campesinato e do operariado pelos situacionistas donos da terra e da fábrica, o colonialismo (o de sempre, o nazi, o fascista e o novíssimo neocolonialismo "humanitário"), o imperialismo (o que morreu e o que constantemente renasce), o racismo de sempre - já mataram muitas mais.
    Importa-se o caríssimo mais com os "Germanos" do que com o abstrato "género humano"? Olhe que eu não: o "Germano" di-lo o senhor em português, e mais de 10 milhões não serão os "Germanos" deste Mundo se o português que fala for o de Portugal; já o "género humano" são esses 10 milhões que o senhor em portuguesíssimo português interpela mais os concretíssimos biliões de seres humanos que lhe não entram nas vernaculares contas de egoísta subtração.

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  9. Uma excelente foto a acompanhar um precioso texto

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  10. Jaime Santos e José sempre a par quando a esquerda da esquerda fala. Clarinho, clarinho, clarinho.

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  11. Calote?

    Mas qual calote qual carapuça. Não podemos ser sérios e falar na responsabilidade de se estar no euro e outras tretas e depois falarmos em "calote"´.De resto é na própria UE que estão algusn dos maiores agiotas

    O que se tem de facto é renegociar a dívida. E estudar e averiguar qual a dívida que não é legítima.
    E deixarmo-nos de comentários a armar que ainda por cima não têm qualquer substracto vindo de quem diz

    Quanto aos sofismas da esquerda mais as afirmações sobre o décife público. E que tal informar-se mais e estudar ao menos um pouco as origens de tal dívida? Em vez de se atirar caninamente ao Estado Social?

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  12. " A tradição da direita são as desigualdades, "lagarta gorda em terra mesquinha" (Aquilino Ribeiro) com os 25 mais ricos a deterem quase 10% do RN. Pobreza exposta à caridade que serve para evitar que os ricos não sejam como os camelos que não passam pelo fundo da agulha (segundo o Evangelho).
    Ter direitos laborais não faz parte da tradição da direita, tendo sempre de ser reduzidos por prejudicarem a "competitividade". O argumento é o mesmo desde o século XIX e os direitos foram arrancados somente através de duras lutas sindicais e populares.
    A tradição da direita é não haver "Estado Social", por isso comentadores esmeram-se a demonstrar que não é mais possível existir, de acordo com as "regras europeias". As regras são para cumprir, as funções sociais do Estado, não. Educação, saúde, cultura é para quem pode pagar, quanto aos outros a Igreja católica que trate deles. É a tradição…
    A propaganda da direita segue a tradição fascista do "caminhando para uma vida melhor" (programa da Emissora Nacional) enquanto o país ficava cada vez mais atrasado e desigual. A tradição da direita é a emigração forçada em massa, o PSD/CDS seguiram-na, incentivaram-na…
    A tradição da direita quanto à liberdade e democracia tem o mesmo carácter que as "liberdades feudais" que os senhores da nobreza reclamavam quando eram tomadas medidas a favor dos interesses populares.
    A sua tradição é a das "medidas de segurança" (em reminiscência do salazarismo) com que querem tirar direitos constitucionais aos eleitores à esquerda do PS – ou mesmo ao PS se este se inclinar para a esquerda!
    A tradição em política é das ideias mais estúpidas a que a direita se agarrou no seu reacionarismo. Se assim fosse, Portugal nunca chegaria a ser um país, não lutava pela independência em 1383-1385, não a recuperaria em 1640 – data que quiseram esquecer – nem faria uma Constituição em 1820, nem derrubaria a ditadura fascista no 25 de ABRIL"

    (Daniel Vaz de Carvalho - Nov de 2015)

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